Destempero em que tinha muita razão, entende-se agora...
Durante uma entrevista na qual discorria sobre os avanços da economia brasileira e sobre a mudança do perfil do trabalhador e a reformatação do mercado de trabalho, ele disse algo mais ou menos assim: a empregada doméstica tal como nós conhecemos é um "animal em extinção"; quem teve, teve, quem não teve não terá mais.
Foi o que bastou para choverem protestos de sindicatos, ONGs, associações de empregados e para "especialistas" em geral caírem de pau no economista. Como assim comparar o nobre trabalhador do lar com um reles animal?
Ele chegou a ser notificado judicialmente a acabou desculpando-se publicamente.
Não deveria, pois estava basicamente certo.
Claro que referir-se a um trabalhador como animal, na expressão que foi usada, não é algo de bom tom, mas também nada que se deva levar ao pé da letra --mesmo porque somos todos animais, alguns até razoavelmente racionais...
O que importava ali, dentro da análise que estava sendo feita, era o contexto, e o contexto estava absolutamente correto: a empregada doméstica tipo casa-grande-e-senzala, aquela pessoa "quase da família" disponível 24 horas por dia, aquela mocinha do interior que a gente ajuda e que nos faz de um tudo, já era, acabou, foi-se, viu, madame?
As muitas e absurdas reações ao Projeto de Emenda Constitucional que amplia e garante os direitos dos trabalhadores domésticos dentro apenas daquilo que é justo e básico mostra bem que a expressão infeliz do ministro refletia o que pensam muitas "patroas" que não se conformam em perder a mamata colonial de que desfrutam em pleno século 21. Quem vai pegar o cocô do cachorrinho agora?!
Como diria a Barbara Gancia, dou um picolé de limão a quem não conheça ao menos uma família abastada que não disponha de uma escravinha do lar, uma mucama de mesa e banho, um ser qualquer cuja existência justifica-se, a estes patrões senhores de engenho, apenas por sua capacidade de servir. Servir bem, a qualquer hora e sem dar um pio.
Acabou a mamata, portanto.
E que fique claro que, para as pessoas de bem que sempre fizeram questão de tratar digna e corretamente suas assistentes, a PEC das empregadas vai significar apenas e tão somente algo em torno de 11% a mais de despesa. Ou seja, nada que não possa ser contornado com planejamento ou boa vontade.
Vai dar trabalho? Vai. Vai ter gente demitida? Vai, mas o mercado se reorganiza rapidamente. Vai ser uma tragédia? Não!
Ah, sim, vai haver bastante desconforto para quem gosta do chazinho na cama pela manhã bem cedo e quer sempre a mesma temperatura da água do escalda pé no fim da noite. Há de se pagar por isso viu?
No mais, bem-vindas ao século 21 trabalhadoras do lar!
Luiz Caversan é jornalista e consultor na área de comunicação
corporativa. Foi repórter especial, diretor da sucursal do Rio da Folha,
editor dos cadernos "Cotidiano", "Ilustrada" e "Dinheiro", entre outras funções.
Escreve aos sábados no site da Folha.
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