quarta-feira, 13 de março de 2013

Alexandre Vannucchi Leme: um companheiro alegre e destemido




Nair Heloisa Bicalho de Sousa
Membro do DCE da USP 1969-1973. Professora da Universidade de Brasília.

Fins de 1969. Um grupo corajoso de estudantes da USP se reúne e decide retomar o movimento estudantil na universidade. Alexandre estava entre eles, sempre animado e disposto a tarefas difíceis. Tempo duro: estudantes com medo da repressão, salas de aula infiltradas com agentes da ditadura, professores cuidadosos com as explicações teóricas e um campus novo no Butantã, sem árvores, distribuído ao longo de um enorme espaço físico descampado que dificultava o circuito estudantil, oposto ao da velha rua Maria Antônia, no centro da cidade, mobilizada pelas denúncias nas paredes e ações coletivas de protesto.
A proposta de recriação do movimento estudantil na USP precisava ser criativa e com chance de sucesso. Alexandre animava nossas discussões e ao final decidimos utilizar a arte como instrumento da política: construir o Diretório Central dos Estudantes e encaminhar uma recepção dos calouros, denominada “Bichusp”, com apresentação de peças de teatro na FAU/USP.
Em condição de semi-clandestinidade, reunimos os estudantes interessados e fomos organizando os grupos de teatro de calouros em diferentes unidades acadêmicas da USP, onde encontramos receptividade à proposta. Fizemos uma apresentação no auditório da FAU/USP, a qual reuniu pela primeira vez depois de 1968 centenas de estudantes na platéia. Alexandre vibrou com o sucesso da iniciativa e passamos para o segundo passo: construir os Centros Acadêmicos.
Os/as estudantes que participaram do teatro foram os/as candidatos/as às eleições e se tornaram membros da primeira gestão estudantil. Inteligentes e dispostos a iniciar um ciclo novo de informações e debates sobre a situação econômica, social e política do país, assim como a respeito dos problemas da USP, os representantes desses centros acadêmicos passaram a agir sob a coordenação do DCE, definindo táticas e estratégias conjuntas. Alexandre estava sempre presente nessas reuniões, com seu entusiasmo e propostas, responsabilizando-se por tarefas políticas de risco.
Além do trabalho com o movimento estudantil, o DCE também cuidava de fazer propaganda política em bairros da periferia da cidade, com distribuição de panfletos em prédios, de modo a alertar a população sobre o governo autoritário do país, com suas práticas de tortura, desaparecimentos, seqüestros e mortes. Alexandre também estava presente nessas ações políticas, doando seu tempo e entusiasmo à causa de um novo país democrático, justo e igualitário.
Foram dias de  muito risco e sofrimento: as prisões de colegas ou conhecidos obrigava a uma rápida desocupação do local de moradia e a redobrar  os cuidados com a segurança pessoal e do grupo. Apesar do zelo com a segurança, Alexandre se tornou vítima da repressão que não poupou tortura para alcançar seus fins, provocando sua morte . Dedicado, corajoso e alegre, ele se tornou uma lembrança carinhosa e amiga que me acompanhou durante  esses últimos quarenta anos .
Alexandre vive no coração dos colegas de seu tempo e faço votos que permaneça vivo   nos corações dos jovens estudantes que desfrutam de um tempo em que é possível fazer política como festa, fruto do tempo em que nós fizemos política como guerra, oferecendo nossas vidas para reconstruir um novo país.     

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