Nair Heloisa Bicalho de Sousa
Membro do DCE da USP 1969-1973. Professora da Universidade
de Brasília.
Fins de 1969.
Um grupo corajoso de estudantes da USP se reúne e decide retomar o movimento estudantil
na universidade. Alexandre estava entre eles, sempre animado e disposto a
tarefas difíceis. Tempo duro: estudantes com medo da repressão, salas de aula
infiltradas com agentes da ditadura, professores cuidadosos com as explicações
teóricas e um campus novo no Butantã, sem árvores, distribuído ao longo de um
enorme espaço físico descampado que dificultava o circuito estudantil, oposto
ao da velha rua Maria Antônia, no centro da cidade, mobilizada pelas denúncias
nas paredes e ações coletivas de protesto.
A proposta de
recriação do movimento estudantil na USP precisava ser criativa e com chance de
sucesso. Alexandre animava nossas discussões e ao final decidimos utilizar a
arte como instrumento da política: construir o Diretório Central dos Estudantes
e encaminhar uma recepção dos calouros, denominada “Bichusp”, com apresentação
de peças de teatro na FAU/USP.
Em condição de
semi-clandestinidade, reunimos os estudantes interessados e fomos organizando
os grupos de teatro de calouros em diferentes unidades acadêmicas da USP, onde
encontramos receptividade à proposta. Fizemos uma apresentação no auditório da
FAU/USP, a qual reuniu pela primeira vez depois de 1968 centenas de estudantes
na platéia. Alexandre vibrou com o sucesso da iniciativa e passamos para o
segundo passo: construir os Centros Acadêmicos.
Os/as
estudantes que participaram do teatro foram os/as candidatos/as às eleições e
se tornaram membros da primeira gestão estudantil. Inteligentes e dispostos a
iniciar um ciclo novo de informações e debates sobre a situação econômica,
social e política do país, assim como a respeito dos problemas da USP, os
representantes desses centros acadêmicos passaram a agir sob a coordenação do
DCE, definindo táticas e estratégias conjuntas. Alexandre estava sempre
presente nessas reuniões, com seu entusiasmo e propostas, responsabilizando-se
por tarefas políticas de risco.
Além do
trabalho com o movimento estudantil, o DCE também cuidava de fazer propaganda
política em bairros da periferia da cidade, com distribuição de panfletos em
prédios, de modo a alertar a população sobre o governo autoritário do país, com
suas práticas de tortura, desaparecimentos, seqüestros e mortes. Alexandre
também estava presente nessas ações políticas, doando seu tempo e entusiasmo à causa
de um novo país democrático, justo e igualitário.
Foram dias
de muito risco e sofrimento: as prisões
de colegas ou conhecidos obrigava a uma rápida desocupação do local de moradia
e a redobrar os cuidados com a segurança
pessoal e do grupo. Apesar do zelo com a segurança, Alexandre se tornou vítima
da repressão que não poupou tortura para alcançar seus fins, provocando sua
morte . Dedicado, corajoso e alegre, ele se tornou uma lembrança carinhosa e
amiga que me acompanhou durante esses
últimos quarenta anos .
Alexandre vive
no coração dos colegas de seu tempo e faço votos que permaneça vivo nos corações dos jovens estudantes que
desfrutam de um tempo em que é possível fazer política como festa, fruto do
tempo em que nós fizemos política como guerra, oferecendo nossas vidas para
reconstruir um novo país.
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