Constituição e Descolonialidade Digital e Impresso: Reconfigurando Direitos e Saberes na Era Tecnológica

Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito

Constituição e Descolonialidade Digital e Impresso: Reconfigurando Direitos e Saberes na Era Tecnológica / organização João Paulo Allain Teixeira. – São Paulo: Editora Dialética, 2025. 368 p.
Retiro da edição a apresentação a cargo do diligente e incansável colega de Recife, professor João Paulo Allain Teixeira, que liderou a realização do Congresso e organizou a edição da obra que a Editora Dialética proporciona e um dos principais animadores de rede que se vai enredando pela interlocução que desde o primeiro congresso se estabeleceu.
Diz a Apresentação:
Potencializadas pela revolução digital, estamos diante de um momento cujas transformações sociais, tão amplas quanto profundas, têm impactado significativamente o modo de vida das pessoas chacoalhando as crenças mais enraizadas sobre os parâmetros que devem orientar a vida em sociedade. Diante deste cenário, segue em expansão um esforço de reflexão pelas diversas áreas do conhecimento cada vez mais dedicados a compreender o significado da revolução digital, seus impactos e suas potencialidades para o mundo contemporâneo.
No campo do direito, este esforço é também percebido através da crescente dedicação de acadêmicos a temas que dialogam com o universo digital. Fala-se assim em “Direito Constitucional Digital”, “Processo Digital”, “Direito Empresarial Digital”, dentre muitas outras aproximações possíveis. Do ponto de vista do campo interdisciplinar envolvendo a Teoria Crítica do Direito e o mundo digital contudo, as contribuições são ainda incipientes. Entendendo que este espaço de debate precisa ser ocupado pelas teorias críticas, realizou-se em 2023 em Porto Alegre um evento formalizando a ideia de criação de uma rede de pesquisa dedicada ao estímulo e potencialização de estudos e investigações em torno da ideia de “Teoria Crítica do Direito e De(s)colonialidade Digital”. O livro que aqui apresentamos é o resultado do segundo encontro da rede, realizado em outubro de 2024 no Recife. O evento “Direito, Constituição e De(s)colonialidade Digital” foi recebido por um Congresso que realizamos anualmente, o Publius, evento já conhecido pelo seu impacto nas reflexões jurídicas nacionais. Nesta edição, o Congresso Publius reuniu pesquisadores que prontamente aceitaram o desafio de juntos refletirmos sobre os temas relativos ao mundo digital em perspectiva de(s)colonial.
Os trabalhos aqui apresentados foram organizados em ordem alfabética de autoria, trazendo um amplo panorama temático contribuindo para o descortínio de caminhos para a consolidação da agenda de pesquisa proposta. Alguns textos conservam a forma coloquial com a qual o(a)s autore(a)s apresentaram no evento, já que passaram por um processo de transcrição.
A Apresentação traz agradecimentos ao pugilato de parceiros cuja colaboração tem sido inestimável, especialmente para a edição do volume formado com as comunicações do segundo encontro, ocorrido em Recife em 2024:
Agradecemos a Raquel Sparemberger e Ivone Lixa pela parceria na idealização da rede, a Thais Wencze pelo entusiasmo e apoio sempre presentes. Aos amigos e parceiros do Publius, Gustavo Ferreira Santos, Marcelo Labanca e Glauco Salomão Leite. A Érica Babini pelo apoio no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Católica de Pernambuco. Agradecemos a toda a equipe de apoio do PPGD, bolsistas e voluntários na pessoa de Thyaly Diniz. A Willaine Araújo pelo diálogo em torno da formatação do evento e sugestões de temas para a programação. A todos os amigos que estiveram conosco no Recife e que agora oferecem suas contribuições para publicação. À CAPES e à FACEPE pelo apoio financeiro sem o qual o evento e a publicação não teriam acontecido
O Sumário do livro dá a medida da rica reflexão que o encontro e agora, a obra, trazem para um tema que vai se tornando altamente interpelante:
DESAFÍOS DEL NUEVO CONSTITUCIONALISMO TRANSFORMADOR FRENTE AL CAPITALISMO DE VIGILANCIA Y AL COLONIALISMO DIGITAL, Alejandro Medici
CIDADANIA DIGITAL E DESAFIOS JURÍDICOS NA ERA DAS BIG TECHS, Alexandre Freire Pimentel
A POSSÍVEL CONTRIBUIÇÃO DOS DIREITOS CULTURAIS COMO ARGUMENTOS CONTRA OS RISCOS DERIVADOS DAS NEUROINVASÕES, Alexandre Henrique Tavares Saldanha
PLURALISMO JURÍDICO E SOCIEDADE DIGITAL: DESAFIOS E PERSPECTIVAS, Antonio Carlos Wolkmer
DECISÃO JURÍDICA NA SOCIEDADE ALGORÍTMICA: OBSERVAÇÕES TECNO-ANIMISTAS E COMUNICACTIVISTAS, Artur Stamford da Silva
ACESSO À JUSTIÇA E DESAFIOS DE INCLUSÃO DIGITAL: OS POVOS INDÍGENAS EM SÃO GABRIEL DA CACHOEIRA – AMAZONAS, Erivaldo Cavalcanti e Silva Filho
PROVA VIRTUAL EDITORA DIALÉTICA PARALELOS COLONIAIS DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL, Fernanda Frizzo Bragato
POVOS ORIGINÁRIOS E PROTEÇÃO DE DADOS, Fernando Antônio de Carvalho Dantas
A SABEDORIA DOS POVOS ORIGINÁRIOS E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL: RISCOS, CRIATIVIDADE E HUMANIDADE, Germana de Oliveira Moraes
INTERNET E DEMOCRACIA: UMA DIFÍCIL RELAÇÃO, Gustavo Ferreira Santos
COLONIALIDADE DIGITAL, NOVAS FORMAS DE DOMINAÇÃO E RESISTÊNCIA, Ivone Fernandes Morcilo Lixa
COLONIALIDADE DIGITAL E TECNODIVERSIDADE NO SISTEMA BRASILEIRO DE JUSTIÇA: TENSÕES, DESAFIOS E PERSPECTIVAS,João Paulo Allain Teixeira
NEOFASCISMOS, SOCIEDADE DIGITAL E AS AMEAÇAS À DEMOCRACIA EM TEMPOS NEOLIBERAIS, João Ricardo Dornelles
HORIZONTES DEMOCRÁTICOS PARA A DESCOLONIZAÇÃO DO MUNDO DIGITAL, José Geraldo de Sousa Júnior
OS PARADOXOS DA MATERNIDADE DE EXPOSIÇÃO: OS MALEFÍCIOS DO CAPITALISMO NA ERA DIGITAL EM FACE DA EXPOSIÇÃO EM MASSA DE CRIANÇAS COMO INSTRUMENTO DE MONETIZAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL, Layla Isabelle Sampaio de Carvalho Leite, Carolina Valença Ferraz
PROVA VIRTUAL EDITORA DIALÉTICA DATAFICAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE PROTEÇÃO SOCIAL E A QUESTÃO DA POBREZA, Lilian Balmant Emerique
NEUROTECNOLOGIA E O EXERCÍCIO DA CAPACIDADE JURÍDICA PELA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: VANTAGENS E RISCOS, Maria Rita de Holanda
A CIBERCULTURA NO CONTEXTO JURÍDICO: DESIGN, ALGORITMOS E REGULAÇÃO, Paloma Mendes Saldanha
RESPONSABILIDADE CIVIL E VIESES DISCRIMINATÓRIOS NO APRENDIZADO DE MÁQUINA, Percival Henriques de Souza Neto
DAS ALDEIAS LOCAIS À ALDEIA GLOBAL: BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OS LIMITES E AS POTENCIALIDADES DA ATUAÇÃO DE POVOS TRADICIONAIS INDÍGENAS E QUILOMBOLAS NA INTERNET, Philippe Oliveira de Almeida, Dante Oliveira Ribeiro das Chagas
COLONIALIDADE DO DIREITO E RACISMO DIGITAL, Raquel Fabiana Lopes Sparemberger
PROTEÇÃO DE DADOS E TECNOLOGIAS: VOZES DE LIDERANÇAS INDÍGENAS KAINGANGS EM CONTEXTOS INTERDISCIPLINARES, Thaís Janaina Wenczenovicz
A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIGITAL E OS DESAFIOS DA CIDADANIA DIGITAL, Theresa Cristine de Albuquerque Nóbrega
COLONIALIDADE FISCAL, ECONOMIA DIGITAL E DESAFIOS PARA A TRIBUTAÇÃO NO BRASIL: UMA REFLEXÃO CRÍTICA SOBRE DESIGUALDADES SOCIAIS E O FUTURO DAS POLÍTICAS FISCAIS, Willaine Araújo Silva
Como se vê do Sumário, tive ensejo de participar do Congresso que deu oriegem ao livro, por especial deferência do caríssimo amigo e colega professor João Paulo Allain Teixeira que me incumbiu de proferir a Conferência Magna: “Horizontes democráticos para a descolonização do mundo digital”.
Confesso que foi a primeira vez que me debrucei sobre o tema, ainda que com algum destemor animado sobretudo pela confiança recíproca que passamos a cultivar João Paulo e eu desde que nos encontramos pela primeira vez, no começo dos anos 1990, em Huelva, no Monatério de la Rábida, sede da Universidad Internacional de Andalucia, ali sob a convocação de Joaquín Herrera Flores, para participar dos programas de pós-graduação em direitos humanos, já então, sob inspiração do grande filósofo, com intuito crítico de re-invenção do campo.
Assim que, tomando o tema geral do Congresso – “Direito, Constituição e De(s)colonialidade Digital (Possibilidades de Aproximação da Teoria Crítica De(s)colonial e efeitos decorrentes da revolução digital em curso)” – comecei esse percurso preocupado em buscar entender, a partir das interconexões possíveis, o que é e o que talvez não seja, entre Direito (Democracia), Constituição e De(s)colonialidade Digital.
Certo, que chega a ser intuitivo, designar o colonialismo digital como uma característica do atual estágio de desenvolvimento do modo de produção capitalista e representar, assim, um largo passo em direção à uma reificação, cada vez mais profunda, da nossa experiência e senso de realidade, elevando a um novo patamar, a objetificação, a alienação do humano inscrito nesse processo.
Nesse aspecto, se o mundo digital pode causar dificuldades de percepção, distanciamento social, aumento da procrastinação, rotina de sono alterada e o aumento de transtornos, como depressão e ansiedade, que são alguns dos efeitos, físicos e psicológicos que a dependência causa nas relações sociais, o que disso repercute no humano que nos constitui e que impactos críticos se projetam nos termos propostos pela temática do Congresso?
A primeira questão que se pode colocar como forma de entrelaçamento a partir desses termos, é a de que humano é esse das humanidades digitais?
Remeto ao meu texto publicado no livro entre páginas 189-204. O certo é que desde então foi-se estabelecendo condições para desenvolver o tema, com a oportunidade de retomar os pontos e até de adensá-los cada vez mais, em novas ocasiões, dada a urgência e a relevância dessa pauta.
Com inesperada agenda, realizou-se agora no início de março na Casina Pio IV, por convocação do Papa Francisco e da Academia de Ciências Sociais do Vaticano, o Seminário “Artificial Intelligence, Justice, and Democracy. Pan-American Committee of Judges for Social Rights and the Franciscan Doctrine, and Fray Bartolomé de las Casas Legal Research Institute”.
As referências completas sobre o Seminário, mesas, painéis, documentos preparatórios e temas podem ser conferidas em https://www.pass.va/en/events/2025/artificial_intelligence.html; e podem ser recuperadas pelo registro do evento no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=bcH871osqbI, incluindo as anotações do último evento Colonization, Decolonization and Neocolonialism from the Perspective of Justice and the Common Good. African and American Intercontinental Meeting of Judges for Social Rights and the Franciscan Doctrine (https://www.pass.va/en/events/2023/colonization.html).
Convidado a participar do Seminário, por impedimento superveniente, não pude comparecer, mas enviei o texto que serviu de base ao que seria minha exposição e que sintetiza minha compreensão sobre o tema. O texto foi acolhido para circular entre os participantes e permitiu que eu pudesse assinar a Declaração de Consenso do Workshop sobre Inteligência Artificial, Justiça e Democracia junto com os participantes, integrando a qualificada lista de subscritores que vai arrolada ao final da Declaração.
O texto, a que dei o mesmo título da conferência do Publius, publicada no livro – “Horizontes éticos e democráticos para la descolonización del mundo digital” – avança para novas cogitações, desde aquelas discutidas em Recife, vale dizer, a questão que pode se dar como forma de entrelaçamento a partir desses termos, qual seja: de que humanidade e de que humanidades estamos falando desde a radicalização decorrente do mundo digital.
No meu texto no Seminário do Vaticano procurei abordar, pois, em resumo, foi a interseção entre a inteligência artificial (IA), a justiça, a democracia e a descolonização digital, destacando a necessidade de uma ética algorítmica (“algor-ética”) que priorize a dignidade humana e evite a delegação de decisões críticas às máquinas. Aliás, o próprio Papa Francisco introduz o conceito de “algor-ética”, enfatizando a necessidade de uma moderação ética dos algoritmos e programas de IA para garantir que sirvam à humanidade. Junto com o Papa Francisco, destaca-se a importância de priorizar a dignidade humana, a autonomia e a capacidade de decisão diante dos avanços da IA, advertindo sobre o perigo de delegar decisões às máquinas quando estas decisões comprometem a liberdade e a responsabilidade humanas e estão desvinculadas de considerações éticas.
No âmbito da justiça, alerta-se para os riscos de permitir que a IA tome decisões que devem permanecer sob controle humano, como na administração da justiça e na aplicação da lei. Critica-se a ideia de que os algoritmos possam governar contextos complexos sem considerações éticas, sublinhando que a justiça deve ser exercida por juízes e sistemas judiciais que respeitem os direitos humanos e a equidade.
Também se critica a mercantilização da educação e da cultura por meio da IA e da educação a distância, alertando sobre os riscos da automatização e da perda de empregos, como ocorreu no caso dos atores de Hollywood. Além disso, discute-se o impacto da IA na economia global, com projeções de que ela poderia adicionar trilhões de dólares, mas à custa da precarização do trabalho.
O texto explora a colonialidade do poder, do saber e do ser, propondo uma crítica contracolonial que vá além da descolonização, questionando as estruturas coloniais ainda presentes na produção do conhecimento. Menciona-se pensadores como Frantz Fanon, Aníbal Quijano e Ailton Krenak, que defendem uma humanidade mais conectada com a Terra e menos centrada na exploração utilitarista.
No campo da educação, destaca-se a necessidade de repensar o uso das tecnologias em sala de aula, promovendo uma pedagogia que fomente a autorregulação e a democracia. Por fim, sublinha-se a importância da autonomia universitária e da liberdade acadêmica em um contexto de avanço do capitalismo universitário, defendendo a educação como um bem público e não como mercadoria.
Enfim, o texto propõe uma reflexão crítica sobre o impacto da IA na sociedade, defendendo uma abordagem ética e decolonial que priorize a dignidade humana, a justiça social e a democracia na era digital, incluindo a aplicação da justiça por sistemas judiciais e juízes que respeitem os princípios éticos e os direitos humanos.
E, a partir daí, a preocupação de sintonia com os pressupostos da convocação do Seminário, inscrito na consideração da dignidade humana e ética na Inteligência Artificial. Abrir essa perspectiva significa levantar questões que nos permitam recuperar o sentido de nossa própria existência, não apenas em termos de existência humana, mas também quanto às relações que estabelecemos entre nós e com o mundo.
Em consonância com a exortação do Papa Francisco para guiar as perspectivas de reflexão que devem orientar este Encontro, as recentes manifestações de dignitários da Santa Sé têm apontado no sentido de preservar a dignidade humana como referência ética para pensar as novas tecnologias.
Um recurso para a paz, mas também uma possível ameaça existencial. Assim, no Fórum da OSCE para Segurança e Cooperação, monsenhor Caccia, observador permanente da Santa Sé na ONU, adverte sobre os riscos associados ao uso de instrumentos inovadores no campo militar, a começar pela Inteligência Artificial, enfatizando a impossibilidade de se governar tais contextos apenas por meio de algoritmos.
Rumo a uma ‘Algor-Ética’: Dignidade Humana na Era da IA. Na convocação deste workshop, o Papa Francisco fez um poderoso chamado para priorizar as considerações éticas no desenvolvimento e uso da inteligência artificial. Ele adverte sobre o perigo de permitir que as máquinas tomem decisões que devem permanecer sob controle humano, especialmente em áreas como sistemas de armas automatizadas, administração da justiça, busca pela verdade e prática da cidadania democrática. De fato, o impacto da IA dependerá de seu uso consciente, das considerações éticas e das estruturas de governança para maximizar os benefícios e minimizar os riscos.
O Santo Padre introduz o conceito de “algor-ética”, enfatizando a necessidade de uma moderação ética dos algoritmos e programas de IA para garantir que sirvam à humanidade. Junto com o Papa Francisco, destacamos a importância de priorizar a dignidade humana, a autonomia e a tomada de decisões frente aos avanços da IA. Advertimos sobre o perigo de delegar decisões às máquinas quando essas decisões minam a liberdade e a responsabilidade humanas e estão desvinculadas de considerações éticas.
Existe, no entanto, o risco de que a IA seja usada para promover o “paradigma tecnocrático”, que considera que todos os problemas do mundo podem ser resolvidos apenas por meios tecnológicos. Dentro desse paradigma, a dignidade humana e a fraternidade são frequentemente subordinadas à busca da eficiência, como se a realidade, a bondade e a verdade emanassem inerentemente do poder tecnológico e econômico. No entanto, a dignidade humana nunca deve ser violada em nome da eficiência. Os desenvolvimentos tecnológicos que não melhoram a vida de todos, mas criam ou agravam desigualdades e conflitos, não podem ser chamados de verdadeiro progresso. Por isso, a IA deve ser colocada a serviço de um desenvolvimento mais saudável, mais humano, mais social e mais integral.”
Desse encontro resultou a Declaração de Consenso do Workshop sobre Inteligência Artificial, Justiça e Democracia. Comitê Pan-Americano de Juízes para os Direitos Sociais e a Doutrina Franciscana e Instituto de Pesquisas Jurídicas Frei Bartolomé de las Casas. Pontifícia Academia de Ciências Sociais do Vaticano, da qual fui um dos subscritores. O texto completo da declaração e outros perspectivas que se colocaram naquele encontro foi tema de recensão nesta Coluna Lido para Você, para a qual remeto: https://estadodedireito.com.br/declaracao-de-consenso-do-workshop-sobre-inteligencia-artificial-justica-e-democracia-comite-pan-americano-de-juizes-para-os-direitos-sociais-e-a-doutrina-franciscana-e-instituto-de-pesquisas-juridi/.
Antes dessa publicação procurei fazer um registro noticioso desse evento em minha Coluna O Direito Achado na Rua (Jornal Brasil Popular), acentuando o caráter de convocação a uma reflexão crítica sobre o impacto da IA na sociedade, inclusive para a abordagem ética decolonial e mais ainda contracolonial que priorize a dignidade humana, a justiça social e a democracia na era digital, incluindo a aplicação da justiça por sistemas judiciais e juízes que respeitem princípios éticos e os direitos humanos.
Acentuei as discussões se concentraram nos desafios éticos impostos pela IA, sua influência na tomada de decisões judiciais e seu potencial para moldar instituições democráticas. Nesse sentido, tal como registrou a Agência de Notícias Católica (https://www.catholicnewsagency.com/news/262567/vatican-conference-examines-artificial-intelligence-implications-for-democracy-justice), para a Irmã Helen Alford, presidente da Pontifícia Academia de Ciências Sociais, em seu discurso de abertura da conferência, em seu discurso inaugural: “Assim como em todos os outros aspectos da vida técnica que precisam de uma estrutura ética, as autoridades da Igreja deixam para os especialistas em um campo específico o fardo e a honra de identificar quais são os principais problemas éticos emergentes naquele campo e, então, trabalhar com eles para indicar as soluções que podem ser propostas aos governos e ao público em geral. Desta forma, a Igreja está presente no debate, tanto depositando confiança nos responsáveis por estas tecnologias e pelos seus usos, como se colocando à disposição para participar e apoiar os esforços morais, éticos e políticos de todas as pessoas de boa vontade para dirigir estas tecnologias de forma adequada.” (https://brasilpopular.com/inteligencia-artificial-justica-e-democracia/).
Na sequência desses seminários promovidos pela Academia de Ciências Sociais do Vaticano, sempre por inspiração do Papa Francisco, ressalta a interlocução que o Pontífice privilegiou mobilizando juízes para a justiça social. Tratei disso, referindo-me a essa novidade – https://brasilpopular.com/juizes-que-se-comprometam-a-realizar-as-promessas-democraticas-do-direito/. E de que modo se articulou a mobilização daí decorrente, de tal modo que ela resultou em duas organicidades estratégicas. A instituição de um coletivo e a reinstalação do Centro de Estudos Frei Bartolomé de las Casas.
.Tratei desse e aqui neste espaço da Coluna O Direito Achado na Rua – https://www.brasilpopular.com/vaticano-conferencia-sobre-colonialismo-descolonizacao-e-neocolonialismo/, para lembrar, que entre os magistrados brasileiros presentes nesses encontros distinguia-se a participação, exatamente do Ministro Lélio Bentes, presidente do Tribunal Superior do Trabalho. E para a minha surpresa, sentada entre os grandes – Boaventura de Sousa Santos e Eugenio Zaffaroni, – a minha ex-aluna Ananda Tostes Isoni, juíza do TRT 10ª região, integrante do Capítulo Brasileiro do Comitê Pan-Americano de Juízes e Juízas para os direitos sociais e Doutrina Franciscana – Copaju Brasil, ela própria, falando depois deles, com uma belíssima exposição que a coloca, em sua perspectiva franciscana, no chamado então feito pelo Papa Francisco para a atuação judicante: “Vocês juízes, em cada decisão, em cada sentença, estão diante da feliz oportunidade de fazer poesia: uma poesia que cure as feridas dos pobres, que integre o planeta, que proteja a Mãe Terra e todos os seus descendentes. Uma poesia que repara, redime e nutre. Não renunciem a esta oportunidade. Assumam a graça a que têm direito, com determinação e coragem. Estejam ciente de que tudo o que contribuírem com sua retidão e compromisso é muito importante”.
Iniciativa da juíza Ananda Isoni, aconteceu em 29 de abril, a inauguração da sede no Brasil do Instituto de Pesquisas Jurídicas Fray Bartolomé de las Casas (IFBC), e da sede do Capítulo Brasil do Comitê Pan-Americano de Juízas e Juízes pelos Direitos Sociais e a Doutrina Franciscana (COPAJU), ambos localizados no Campus da Universidade Católica de Brasília (UCB). O evento de instalação, a propósito, teve aula magna do professor Eugenio Raúl Zaffaroni (do grupo dirigente do Copaju América Latina) exatamente sobre “Inteligência Artificial, Justiça e Democracia”.
E, na mesma ocasião, nos dias 29 e 30, e não por coincidência ainda que não estruturalmente vinculados, a juíza Ananda Isoni, instalou no espaço e na programação da Escola Nacional da Magistratura Trabalhista (ENAMAT), o Seminário Direito à Saúde e Segurança do Trabalho e Novas Tecnologias, com dois painéis principais: 1. Inteligência Artificial: Desafios e Perspectivas para a Promoção do Trabalho Decente; 2. Trabalho em Plataformas Digitais: Viver e Morrer sobre Rodas. Participei do primeiro painel, juntamente com colegas acadêmicos (UFRJ e USP), ensejo para continuar a aprofundar o tema que pude começar a esboçar, conforme meu texto no livro ora Lido para Você.
Por último, em face da publicação na Coluna Lido para Você de minha recensão a propósito da Declaração de Consenso do Workshop sobre Inteligência Artificial, Justiça e Democracia, a coordenação do Programa Diálogos ADUnB (a ADUnB é a seção sindical a que se filiam os professores da UnB) pautou episódio com a minha participação sobre esse tema, por meio de entrevista conduzida pelo professor Pedro Mandagará, em gravação com transmissão pela TV Comunitária de Brasília e Youtube da ADUnB.