domingo, 1 de dezembro de 2013

Justiça e Paz se abraçarão




D. Sérgio da Rocha
Arcebispo de Brasília
José Márcio Moura Silva
Presidente da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília(*)

Brasília é uma cidade em permanente mudança. Fruto da experiência de homens e mulheres, plantada em meio ao planalto central, a cidade pensada como una, circunscrita ao Plano Piloto, transformou-se numa constelação urbana – formada pelo centro e as demais cidades. Nesse quadro, a expansão recente do processo de urbanização trouxe consigo mudanças incríveis nos estilos de vida. Temos hoje uma Brasília marcada por profundas desigualdades sociais, múltiplos interesses de grupos e extensos problemas que merecem a atenção de todos e todas.

A Arquidiocese de Brasília criou sua Comissão Justiça e Paz a partir dessas questões como campos de ação da Igreja para a justiça e a paz. No momento de sua fundação (1986) lançou projeto constituído pelos pressupostos da cidadania em que muitas dessas percepções sobre Brasília já estavam pontuadas. O programa da Comissão para as lidas e as lutas da cidade foi parte do universo de democratização. Ali, já estava a percepção de que Brasília era mais que suas escalas arquitetônica, monumental e bucólica. Brasília, além de sua condição de urbs e de civitas, bela, moderna e funcional, tinha e tem a dimensão de verdadeira polis, obra do povo organizado para atribuir a ela a escala humana que a realiza como cidade. Com o tempo, foi necessário reconstruir a Comissão Justiça e Paz para adaptar-se a estes novos tempos, com o cuidado de garantir a tradição dos trabalhos realizados, e o carinho de pensar o futuro com ousadia. É por isso toda a Igreja Católica de Brasília, como comunidade de comunhão e conversão, celebra o novo ciclo da Comissão Justiça e Paz, ao retomar tais percepções, propor outras e colocar numa grande roda de conversas as muitas visões da cidade. A Comissão Justiça e Paz coloca-se como espaço de mediação social a serviço da cidade e de sua população, de seus desafios e de seus horizontes, de forma pluralista e comprometida com o Evangelho. Entre o planejamento original e a vida, entre a cidade sonhada, desejada e sua concretude, há diversas contradições em Brasília – a lei, a sua (des)obediência e a superação das tensões por parte das pessoas, instituições, grupos e as conquistas de seus direitos e deveres.

A partir da rica experiência dos profetas do Antigo Testamento para anunciar a justiça, da mensagem do Evangelho e da missão da Comissão Justiça e Paz deverá denunciar tudo que possa lesar a justiça e colocar em perigo a paz. Ao mesmo tempo, poderá e deverá intervir, a partir do diálogo construtivo e respeitoso, com os diversos níveis eclesiais, institucionais e da sociedade, com o objetivo de promover princípios, estimular o respeito entre todos e todas, defender a dignidade humana e lutar pelo fortalecimento da democracia e da cidadania. Por isso, a Comissão Justiça e Paz pode e deve se colocar como sentinela dos direitos sociais, buscando inspiração na riqueza da espiritualidade cristã, direcionando-a às “periferias existenciais”, na feliz expressão do Papa Francisco, ao invés de ficar limitada à dinâmica interna.

Os desafios para esta nova etapa da Comissão Justiça e Paz estão em torno de dois carismas essenciais na Igreja: a profecia e o serviço à sociedade. O contexto é Brasília em um mundo em mudança. Uma realidade marcada por grandes mudanças, com um alcance global que, com diferenças e matizes, afetam o mundo inteiro. Os fenômenos da globalização e das mudanças da ciência e da tecnologia impactam a cultura, a economia, a política, as ciências, a educação, o esporte, as artes e também, naturalmente, a religião. Uma realidade que para o ser humano se tornou cada vez mais sem brilho e complexa. Aliás, o Papa Francisco tem acentuado a exigência desta presença no mundo, mesmo com os riscos de sofrer as mesmas consequências que podem acometer qualquer pessoa que saia à rua. Entretanto, poderemos ter a confortante alegria de ser fermento de uma Brasília justa e solidária.

O serviço, humilde e comprometido com a sociedade, não deixará de ser uma dimensão permanente em busca da superação das desigualdades e afirmação dos direitos humanos, da justiça e da paz. Esta é a outra essência de uma Comissão que, em nome da Arquidiocese de Brasília, tem que combater o bom combate com coragem e amor, mas com firmeza e atenção aos pequenos e desprotegidos que nos desafiam a descobrir o próprio rosto do Senhor nas faces sofridas dos irmãos e das irmãs.  

(*) São também membros da CJP: Agnaldo Cuoco Portugal, Elizeu Francisco Calsing, Hélio José da Silva, José Carlos Soares Pinto, Pe. José Ernanne Pinheiro, José Geraldo de Sousa Junior, Jovita José Rosa, Melillo Dinis do Nascimento, Ricardo Spíndola Mariz, Simone Furquim Guimarães, Terezinha Lucia Santin e Pe. Thierry Linard de Guertechin 



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