domingo, 14 de agosto de 2016

PARA UM VERDADEIRO DEBATE SOBRE OS DIREITOS HUMANOS


Gladstone Leonel Júnior[1]

Para aqueles que enxergam os direitos humanos como mero conjunto de tratados internacionais e convenções, os quais respaldam o indivíduo nas suas garantias, o livro de Antonio Escrivão Filho e José Geraldo de Sousa Júnior trata de apimentar esse debate. A obra “Para um debate teórico-conceitual e político sobre os Direitos Humanos”, que será lançada esse mês pela D’Plácido Editora, é pioneira na abordagem do tema e corajosa ao enfrentar um debate tão delicado.
Por um ponto de vista, os direitos humanos teriam aportado em solo brasileiro e na América Latina junto com os europeus, seus ideais, instituições jurídicas e políticas que viriam proclamar a liberdade e igualdade, como observado na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 ou na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão do século XVIII.  Trata-se de um olhar desse fenômeno.
Parece haver outra versão, outra história, não oficial, não escrita nem transmitida pelas instituições. Uma história das ausências produzidas em um cotidiano de opressão e exploração. Desse ambiente emergem as lutas de resistência, as quais preenchem os fatos históricos brasileiros, como pode se verificar no estudo da Confederação do Equador; da Cabanagem; da Balaiada; da Revolta dos Malês; da Inconfidência Mineira; de Canudos; do Contestado; da resistência à Ditadura militar entre outras. Assim, a opção de vida digna para os povos à margem da ordem e progresso instituídos foi a luta, ou seja, elemento que assegura um olhar visceral da produção de direitos humanos.
Na obra aqui destacada, também ganha espaço o avanço das conquistas democráticas pós-constituição de 1988 e o cenário de protagonismo dos movimentos sociais nesse processo de afirmação de direitos fundamentais. O processo democrático inaugurado no Brasil com a transição do regime autoritário é caracterizado pela emergência de novos sujeitos coletivos que carregam consigo o anúncio de novos direitos e uma nova agenda da política de direitos.
O debate de direitos humanos realizado pelo livro traz um recorte próprio do seu local de partida, apontando a importância dos recentes processos constituintes populares na América Latina e a ascensão do novo constitucionalismo latino-americano com base democrática e integradora. É uma análise de direitos humanos que extrapola as limitações eurocentradas e coloniais, alcançando a realidade dos sujeitos historicamente excluídos da própria construção jurídico-institucional.  
A dimensão política da justiça e a reforma do ensino jurídico no Brasil também são temas fundamentais, que os autores não se furtam a realizar de maneira comprometida com a efetivação dos direitos humanos. Algo necessário quando se almeja repensar e democratizar o direito e a sua aplicação.  
Todas essas questões fundamentais trazidas são frutos de uma análise de direitos humanos permeada pelo Direito Achado na Rua, o qual se constrói em uma crítica que reconhece a pluralidade e exige a democracia, a partir dos pilares do respeito e da fidelidade junto ao povo, ressaltada nessa Escola de Roberto Lyra Filho. A rua se incumbe de materializar o espaço de criação e realização do direito.   

Os autores, de forma competente, apontam para uma nova cultura política dos direitos humanos. Cabe a nós agregarmos o conteúdo e botá-los em prática. A luta pelos direitos humanos segue, a rua é o caminho!

 * Publicada com o titulo Os Direitos Humanos na Rua, no Jornal Correio Braziliense, Caderno Diversão & Arte, edição de 12/08/2016, pág. 3.


[1] Doutor em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília. Realizou estágio doutoral na Facultat de Dret da Universitat de València, Espanha. Está no pós-doutorado em Direitos Humanos e Cidadania pela Universidade de Brasília. 

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