Gladstone Leonel Júnior[1]
Para aqueles que enxergam os direitos
humanos como mero conjunto de tratados internacionais e convenções, os quais
respaldam o indivíduo nas suas garantias, o livro de Antonio Escrivão Filho e
José Geraldo de Sousa Júnior trata de apimentar esse debate. A obra “Para um debate teórico-conceitual e político
sobre os Direitos Humanos”, que
será lançada esse mês pela D’Plácido Editora, é pioneira na abordagem do tema e
corajosa ao enfrentar um debate tão delicado.
Por um ponto de vista, os direitos
humanos teriam aportado em solo brasileiro e na América Latina junto com os
europeus, seus ideais, instituições jurídicas e políticas que viriam proclamar
a liberdade e igualdade, como observado na Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948 ou na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão do século
XVIII. Trata-se de um olhar desse
fenômeno.
Parece haver outra versão, outra
história, não oficial, não escrita nem transmitida pelas instituições. Uma
história das ausências produzidas em um cotidiano de opressão e exploração.
Desse ambiente emergem as lutas de resistência, as quais preenchem os fatos
históricos brasileiros, como pode se verificar no estudo da Confederação do
Equador; da Cabanagem; da Balaiada; da Revolta dos Malês; da Inconfidência
Mineira; de Canudos; do Contestado; da resistência à Ditadura militar entre
outras. Assim, a opção de vida digna para os povos à margem da ordem e
progresso instituídos foi a luta, ou seja, elemento que assegura um olhar
visceral da produção de direitos humanos.
Na obra aqui destacada, também ganha
espaço o avanço das conquistas
democráticas pós-constituição de 1988 e o cenário de protagonismo dos
movimentos sociais nesse processo de afirmação de direitos fundamentais. O
processo democrático inaugurado no Brasil com a transição do regime autoritário
é caracterizado pela emergência de novos sujeitos coletivos que carregam
consigo o anúncio de novos direitos e uma nova agenda da política de direitos.
O debate de direitos humanos
realizado pelo livro traz um recorte próprio do seu local de partida, apontando
a importância dos recentes processos constituintes populares na América Latina
e a ascensão do novo constitucionalismo latino-americano com base democrática e
integradora. É uma análise de direitos humanos que extrapola as limitações
eurocentradas e coloniais, alcançando a realidade dos sujeitos historicamente
excluídos da própria construção jurídico-institucional.
A dimensão política da justiça e a
reforma do ensino jurídico no Brasil também são temas fundamentais, que os
autores não se furtam a realizar de maneira comprometida com a efetivação dos
direitos humanos. Algo necessário quando se almeja repensar e democratizar o
direito e a sua aplicação.
Todas
essas questões fundamentais trazidas são frutos de uma análise de direitos
humanos permeada pelo Direito Achado na
Rua, o qual se constrói em uma crítica que reconhece a pluralidade e exige
a democracia, a partir dos pilares do respeito e da fidelidade junto ao povo,
ressaltada nessa Escola de Roberto Lyra Filho. A rua se incumbe de materializar
o espaço de criação e realização do direito.
Os
autores, de forma competente, apontam para uma nova cultura política dos
direitos humanos. Cabe a nós agregarmos o conteúdo e botá-los em prática. A
luta pelos direitos humanos segue, a rua é o caminho!
* Publicada
com o titulo Os Direitos Humanos na Rua, no Jornal Correio Braziliense,
Caderno Diversão & Arte, edição de 12/08/2016, pág. 3.
[1] Doutor
em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília. Realizou
estágio doutoral na Facultat de Dret da
Universitat de València, Espanha. Está no pós-doutorado em Direitos Humanos e
Cidadania pela Universidade de Brasília.
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