sábado, 25 de maio de 2019

Direito à saúde e participação social: a importância das conferências de saúde

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Ludmila Cerqueira Correia*
O ano de 2019 já está sendo marcado pelos retrocessos em diversas políticas sociais, especialmente no âmbito das políticas públicas de saúde. Se é verdade que a Constituição Federal de 1988 continua valendo, o direito à saúde continua sendo um direito de todos e dever do Estado. Significa dizer que o direito à saúde se constitui como um direito social, indissociável do direito à vida, integrando, portanto, o conjunto de direitos humanos, e devendo ser garantido pelo Estado a todas as pessoas através de políticas sociais e econômicas.
Destaque-se que a participação social na área da saúde decorre da luta do Movimento da Reforma Sanitária, enquanto sujeito coletivo de direito, para a conquista e construção do direito à saúde no Brasil, sobretudo em relação à concepção ampliada de saúde. E são os mecanismos de participação social criados após a Constituição de 1988, como os conselhos e conferências de saúde, que configuram o modelo de democracia participativa, do qual não podemos abrir mão.
Este ano também é marcado pela realização da 16ª Conferência Nacional de Saúde, que tem como objetivo principal traçar as diretrizes para as políticas públicas de saúde no Brasil. Na conjuntura atual, esta Conferência ganha ainda mais centralidade, pois além de se constituir como um espaço de defesa da democracia e do Sistema Único de Saúde (SUS), será um espaço de resistência contra a forças conservadoras e autoritárias que estão presentes e atuando nesse contexto.
Daí a importância da participação de representantes dos movimentos sociais e de organizações, que já vêm acumulando forças não só na construção do sistema público de saúde, como também para enfrentar os desafios que estão postos e os que virão. Nesse contexto, a Emenda Constitucional nº 95/2016 representa uma das mais graves intervenções nas políticas de saúde, ao lado da Reforma Trabalhista, da lei das terceirizações e da PEC da Reforma da Previdência, uma vez que possibilita a redução do SUS. Embora seja reconhecida a universalidade do direito à saúde na Constituição de 1988, o SUS não está consolidado como universal, tendo em vista o seu processo de mercantilização.
Atualmente, constata-se o agravamento do subfinanciamento público do SUS, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 95/2016, que reduz progressivamente os seus recursos por vinte anos, e identificam-se retrocessos na estrutura da rede hierarquizada do sistema (organização do atendimento em diferentes níveis de complexidade).
O SUS cabe na Constituição, desde que seja restabelecida a democracia no Brasil e que se reconheça a desigualdade como um dos principais problemas do país. Por tratar-se de um sistema amplo e complexo, faz-se necessária a sua rearticulação com a Previdência e a Assistência Social, além de uma reforma política democrática e uma reforma tributária socialmente justa, visando alcançar os seus objetivos e desempenhar as suas atribuições.
Todas estas são questões importantes para os debates e deliberações nas conferências municipais, estaduais e nacional de saúde este ano. Mais ainda, é imprescindível que tais conferências se revelem como trincheira de luta pela democracia e por um SUS universal, público, integral e de qualidade.
* Professora da UFPB, coordena o Projeto Loucura e Cidadania. É pesquisadora do Grupo de Pesquisa O Direito Achado na Rua

sexta-feira, 24 de maio de 2019

O Direito Achado na Rua como horizonte democrático-participativo: do espaço institucional à rua


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Renata Carolina Corrêa Vieira
José Geraldo de Sousa Junior
Há dias (entre 24 e 26 de abril deste ano), contra todas as ameaças e o simbólico repressor, realizou-se em Brasília, em plena Esplanada dos Ministérios, o XV Acampamento Terra Livre, mobilização indígena anual,  “para dizer ao Brasil e ao mundo que estamos vivos e que continuaremos em luta em âmbito local, regional, nacional e internacional”, porque  “Nossa história não começa em 1988! Marco Temporal Não! Estamos aqui mobilizados para dizer ao Brasil e ao mundo que estamos vivos, que continuamos em luta pela conquista e defesa dos nossos territórios e de políticas públicas que respeitem nossos modos de ser, que resistiremos custe o que custar. Seguiremos dando a nossa contribuição na construção de uma sociedade realmente democrática, plural, justa e solidária, por um Estado pluricultural e multiétnico de fato e de direito, por um ambiente equilibrado para nós e para toda a sociedade brasileira, pelo Bem Viver das nossas atuais e futuras gerações, da Mãe Natureza e da Humanidade”.
Em 2018, o então candidato hoje Presidente da República anunciou: “vou acabar com todo ativismo no Brasil”. Desde então os registros são contundentes, no plano das políticas de gestão e de inciativa legislativa, fortes na criminalização do protesto e da reivindicação de direitos e na reconfiguração das categorias e dos institutos que orientam as atitudes e o comportamento dos agentes públicos, numa clara inversão de valores a partir do que a propriedade volta a prevalecer sobre a vida (sugestão de defesa armada do latifúndio) e os bens sociais são subjugados à lógica econômica com a mercadorização (saúde, educação) e a privatização do público (transferência para o privado da infraestrutura de bens econômicos, dos equipamentos e dos serviços de interesse social) com o desmantelamento da base política de participação, de deliberação, de avaliação e de controle social previstos na Constituição.
Contudo, essa clivagem alienadora da soberania nacional e das reservas estratégicas de apoio social, não se fará sem que a esse movimento entreguista e vicário seja fortemente inibido por meio de respostas igualmente contundentes dos movimentos sociais e de articulações mobilizadas das organizações sociais.
Assim é que já se põem na rua, em protesto, estudantes, professores e seus segmentos de apoio, contra as iniciativas de cortes e de redução dos investimentos e das inversões orçamentárias de financiamento e de fomento da educação, da ciência e da tecnologia. Se a institucionalidade se reduz como espaço político, a rua passa a ser o lugar de protagonismo para afirmar a cidadania e os direitos.
Com sua presença orgulhosa e consciente, as comunidades indígenas brasileiras confrontaram a hostilidade de uma governança encastelada na desfaçatez de sua vassalagem a uma agenda ultra-neoliberal, e com a capacidade instituinte de suas organizações –   Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e Mobilização Nacional Indígena (MNI) –reafirmaram o seu “compromisso de fortalecer as alianças com todos os setores da sociedade, do campo e da cidade, que também têm sido atacados em seus direitos e formas de existência no Brasil e no mundo” e de seguir dando a sua “contribuição na construção de uma sociedade realmente democrática, plural, justa e solidária, por um Estado pluricultural e multiétnico de fato e de direito, por um ambiente equilibrado para nós e para toda a sociedade brasileira, pelo Bem Viver das nossas atuais e futuras gerações, da Mãe Natureza e da Humanidade: Resistiremos, custe o que custar. Não é nesse governo que os povos indígenas vão baixar a cabeça!”.
E se nesse movimento dialético social do direito se reconhece o protagonismo dos sujeitos coletivos, representados aqui pelos povos indígenas, conforme temos sustentado nesta Coluna, é a partir do referencial teórico denominado O Direito Achado na Rua que se apresenta um horizonte que aponta novas alternativas para a emancipação e a construção de um direito como liberdade em meio a este cenário de desmonte de direitos e consolidação de um estado colonizador.
Não se trata aqui, como adverte Marcelo Semer, de usar o álibi da voz das ruas, num processo que sirva de componente perigoso para dar curso a vocações iluministas e autoritárias de memória cruenta no curso da história, mas, como ele próprio adverte, de zelar pela Constituição.
Cuida-se, antes, de recuperar democrática e legitimamente o espaço publico, a rua, e de dar atenção ao quadro de “disputas hermenêuticas” pela hegemonia narrativa das promessas constitucionais, atraindo para o palco da política de modo instituinte o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, para lhes atribuir nova institucionalidade, as divisões e os conflitos da sociedade brasileira. Dar conta, ao final, que os direitos e as subjetividades que lhes dão concretude “não são quantidades, mas relações”, e que, portanto, não podem ser esvaziados de sentido pelo seu reconhecimento apenas formal e enumerativo, nem na legislação, nem na jurisprudência, nem pela manifestação delirante de um salvador da pátria, de um Führer ou de um messias que se substituam aos processos de legítima organização social da liberdade, na medida mesma da transformação da  multidão transeunte em povo organizado.
Mesmo em sede de interpretação da Constituição, pode-se conferir definição jurídica diferente à realidade fática sob julgamento. Exemplo disso é o voto paradigmático, em seu refinamento técnico ou seu profundo sentido humano, proferido pelo Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, quando do julgamento no STJ do habeas-corpus no. 4.399-SP, em que foram pacientes Diolinda Alves de Souza e outras lideranças do MST.
O Tribunal como é sabido, e como se pode ver do acórdão a cargo do relator ministro William Patterson, concedeu a liberdade aos pacientes. Em voto de larga repercussão, inclusive com divulgação próxima a uma dezena de idiomas, o ministro Cernicchiaro (que à época presidia a Comissão de Reforma do Código Penal), não perde de vista o conceito histórico no qual são designadas as circunstâncias factuais do tema em discussão. O ministro põe em relevo a condicionalidade da atuação das “chamadas instâncias formais de controle da criminalidade, sujeitas, segundo ele, à posição política, econômica e social da pessoa”.
Finalmente, como membro legítimo da comunidade aberta de realizadores da Constituição, pondera judiciosamente a condição prejudicial na qual se encontram os pacientes, reconhecendo que “as chamadas classes sociais menos favorecidas não têm acesso político ao governo, a fim de conseguir preferencia na implantação de programa posto na Constituição da República”.Sua decisão é descriminalizadora, acentuando novas dimensões da subjetividade jurídica em cujo âmbito Mauro Almeida Noleto situa “a titularidade de direitos em perspectiva emancipatória”. Decide, pois, “não poder ser considerado esbulhador aquele que ocupa uma terra para fazer cumprir a promessa constitucional da Reforma Agrária”.
Mas o Ministro disse mais em seu voto, depois configurado como voto condutor do acórdão porque ele foi designado redator por ter conduzido a divergência vencedora na decisão. Ele trouxe a crucial distinção, exposta já em 1996, ano em que a decisão foi proferida, entre o direito que é achado na rua, de modo instituinte, formulado por organização social legitimamente reconhecida, um movimento social no qual se inscreva um sujeito coletivo de direito (MST), e as vozes difusas da rua,na forma, diz ele, clamor público. Contrapondo à condição de classes sociais, com modo de atuação que lhes confere posição política, econômica e social, o Ministro ressalva que “ordem pública, clamor público precisam ser recebidos com cautela. Podem ser gerados artificialmente, para dar ideia de inquietação na sociedade. Clamor público, ademais, não se confunde com reações (as vezes organizadas) de proprietários de área que possam vir a ser desapropriadas para a reforma agrária”No caso dos pacientes, “há sentido, finalidade diferente. Revela sentido amplo, socialmente de maior grandeza, qual seja, a implantação da reforma agrária”objeto de promessa constitucional.
Se por um lado temos o estado colonizador, racista e sexista, por outro temos a luta dos movimentos sociais que se posicionam frente às ameaças de seus direitos, garantindo a manutenção daquilo que está inscrito nas declarações de direitos humanos e reivindicando o protagonismo enquanto sujeitos coletivos enunciadores de seus próprios direitos. Portanto, voltemos à rua, como nos versos de Cassiano Ricardo, em Sala de Espera, “onde cada um de nós é um pouco mais dos outros do que de si mesmo”, “a rua onde todos se reúnem num só ninguém coletivo”.

terça-feira, 21 de maio de 2019

Pacote anticrime de Moro é um projeto elitista e equivocado, afirma professor da UnB

 
De Brasília (Agência RBC News)
“Em um país de desigualdade social e com graves problemas de segurança pública, é estarrecedor pensar que uma pessoa que decidiu por muitos anos a vida de brasileiros aja assim”. A afirmação é do professor Eduardo Xavier Lemos, mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB), ao analisar o pacote anticrime apresentado pelo ministro Sérgio Moro ao Congresso Nacional.
Esta semana que passou, o projeto do ex-juiz da Operação Lava Jato teve mais uma rodada de debates na Câmara dos Deputados. Trata-se de uma proposta extremamente polêmica que vem encontrando muita oposição por parte de renomados estudiosos sobre o tema. O professor Eduardo Lemos, que também é da Comissão Justiça e Paz da e membro da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília, afirma que a proposta de Sérgio Moro é “um documento autoritário, autocentrado e em descompasso com o Estado Democrático de Direito”.
“É importante reforçar o caráter ultrapunitivista da Lei Anticrime, sem negar o eventual respaldo sanguinário do senso comum, é a temperança e razão que se espera do Ministério da Justiça, e ao inverso do esperado, o ordenamento proposto vai à contramão do pensamento contemporâneo das ciências penais e é um sério agravante para um país que vive relevante crise econômica e significativos índices de encarceramento”, sentencia o professor. “Por esse sentido, avançar sob as reflexões de penas alternativas, o desencarceramento, o estímulo à mediação e alternativas para lidar com o conflito penal, são uma necessidade social e demonstram o grau de sapiência do administrador público”, acrescenta.
“De pronto, salta aos olhos que é um anteprojeto que causa significativas alterações ao ordenamento jurídico pátrio, que sequer tenha uma exposição de motivos para respaldar e esclarecer seu significado e justificativa, bem como os elementos técnicos, teóricos que norteiam o material que, caso aprovado, transformará profundamente a vida da população brasileira”, critica o professor Eduardo lemos.
Segundo ele, a proposta de Moro alterará substancialmente Código Penal brasileiro. “O texto equivocadamente clama para a estratégia normativa e ultrapunitivista, a partir do endurecimento da legislação penal e da diminuição das garantias processuais aos réus, soluções essas, que há tempos são demonstradas pela ciência penal como meramente populistas e inócuas para lidar com os conflitos sociais, servindo apenas para inflar o sistema carcerário e reforçar o ciclo da violência”, alerta o professor.
“O equivocado e mal redigido anteprojeto parte do pressuposto que a lei controlará a sociedade, sem avaliar os reflexos secundários que as alterações legislativas terão no cotidiano da sociedade brasileira e no dia a dia da Justiça do país, e assim, na ganância por punição desmedida, olvida-se da misericórdia e da redenção. Pergunte-se: haverá justiça na sede de vingança?”, indaga o professor.
De acordo com o professor Eduardo Lemos, a proposta de Sérgio Moro “transparece a intenção de oficializar eventuais ‘lacunas’ legislativas, à margem da legislação”, movido “por aquilo que cientificamente se denomina ativismo judicial”.
Outro ponto é que o pacote “procura oficializar os convênios, acordos e compartilhamento de provas entre órgãos investigativos nacionais e estrangeiros, não exigindo qualquer previsão em tratado internacional assinado pelo Brasil com a justiça conveniada ou qualquer formalização ou autenticação especial para o compartilhamento de tais informações, o que também causa estranheza, vez que é uma questão delicada e sigilosa da Operação Lava Jato”.
As propostas, alerta o professor, além de superdimensionar o Ministério Público, “autorizando a proposição de acordos de não investigação ou mesmo de aplicação imediata da pena pelo Parquet à defesa, a partir da confissão do delito pelo réu, o que ademais de fortalecer em demasia o órgão ministerial”, potencializa a arbitrariedade dos procuradores e promotores, “uma vez que o acordo poderá (e não deverá!), ser oferecido”. Esta situação, em um país de imensa desigualdade no acesso à Justiça, acrescenta Eduardo Lemos, “transformará o instrumento em acordos forçados com réus fragilizados sem a devida assistência de seu defensor, servindo o instrumento para, mais uma vez, favorecer os polos mais fortes da relação jurídica”.
O professor aponta ainda equívocos técnicos de redação no trecho do texto de Sérgio Moro que cria as polêmicas excludentes de punição penal. O alerta é em relação a expressões subjetivas como “medo” e “surpresa”, termos pouco técnicos e dúbios, “que empoderam a já hipertrofiada autoridade judiciária, possibilitando-a absolver ou condenar o cidadão em face da diferente experiência emocional vivida pelo magistrado”.
“No mesmo sentido causa profunda preocupação que as excludentes do medo, surpresa e violenta emoção, sirvam, para bem da verdade, como instrumentos que reforcem o preconceito e a perseguição de vulneráveis a partir da rotulação e da estigmatização social de raça e cor, orientação sexual, religião e gênero, gerando a impunidade sob a alcunha do receio, do espanto e da defesa da honra”, acrescenta.
Eduardo Lemos atenta ainda para a possibilidade de as alterações que Sérgio Moro pretende na legislação brasileira possa gerar “significativo conflito nos tribunais, gerando lentidão e tumulto no Poder Judiciário”. Isto porque “toda legislação criada no país deve acordar com posições pacificadas nas cortes superiores e, por esse sentido, a melhor técnica desaconselha que temas em dissonância com decisões recorrentes, sumuladas e por muitas décadas assentadas, sejam apresentados como nova legislação”.
O pacote também desrespeita o princípio da individualização das penas, previsto no artigo 5º da Constituição Federal, estabelecer o regime obrigatoriamente fechado em diversas situações, impondo o regime inicial fechado em outras e vedando as saídas temporárias aos aprisionados. “No mesmo caminho, propôs ao estabelecimento prisional federal um sistema de execução penal típico do Regime Disciplinar Diferenciado. Ocorre que o RDD tem limite temporal de 360 dias e somente ocorre em caso de falta grave, não havendo qualquer dispositivo legal que autorize o tratamento distinto para as pessoas encarceradas em prisão federal, o que levará tumulto às cortes brasileiras e tratamento desigual para cidadãos do mesmo país”, pontua.
A proposta do ministro da Justiça também é ambígua, aponta o professor, dando margem a interpretação do magistrado, o que sempre foi criticado pelo próprio Sérgio Moro quando juiz. “É possível perceber esse padrão legislativo quando do endurecimento do crime de resistência que passa para penas de seis a 30 anos quando causar risco de morte a autoridade, novamente hiperinflando o poder dos agentes do estado, que em regra tendem a reforçar o arbítrio estatal frente ao cidadão”, exemplifica.
“É importante reforçar que qualquer proposição de alteração processual penal sem profunda discussão com os atores processuais causará profundos danos no cotidiano dos tribunais brasileiros, pois a visão de um único agente não pode refletir a complexidade do sistema processual brasileiro”, acrescenta.
Por fim, o professor critica a falta de debate sobre o projeto de Moro. “Elaboração de uma melhor estratégia para o sistema penal brasileiro deve necessariamente passar por profundos debates com a sociedade civil organizada, com a Ordem dos Advogados do Brasil, com o Ministério Público, a Defensoria Pública, os diversos órgãos de representação da Magistratura, o próprio Ministério da Justiça, com o Congresso Nacional e com a Academia, em comunhão de ideais e espaço equânime para deliberação de problemas, expectativas, anseios e frustrações. A participação dessas entidades em longo e profundo debate se faz fundante para que qualquer alteração legislativa seja verdadeiramente democrática”, propõe.
E dá um último alerta: “ão há como fechar os olhos para o avanço das pesquisas, as experiências bem sucedidas de administração do sistema penal em outros países, fazendo-se necessário um olhar iluminado, voltado para as garantias ao cidadão e proteção do indivíduo, e não para o pensamento obscuro que apenas fortalece o despotismo e a tirania”.

segunda-feira, 6 de maio de 2019

MANIFESTO DE JURISTAS EM DEFESA DA UNIVERSIDADE PÚBICA, DA CONSTITUIÇÃO E DA DEMOCRACIA

ATO "TRANSGRESSOR"

Corte de 30% na verba de universidades federais fere a Constituição, dizem juristas

Um manifesto assinado por 265 juristas afirma que há desvio de finalidade e ofensa à Constituição Federal na decisão do Ministério da Educação de cortar 30% da verba destinada às universidades federais. O ato do Poder Executivo foi classificado por eles como “transgressor”.
“No primeiro caso, com motivação imprópria — reprimir 'balbúrdia' — por incidir em responsabilidade, considerando a exigência de adequada fundamentação do ato, que deve respeitar a impessoalidade, a transparência e a legalidade e não a objeção difusa de politização. No segundo caso, com ofensa também às normas convencionais no âmbito da autonomia universitária”, diz trecho do documento.
Os juristas citam também o Comentário Geral 13 do Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização das Nações Unidas: “A satisfação da liberdade acadêmica é imprescindível à autonomia das instituições de ensino superior. A autonomia é o grau de autogoverno necessário para que sejam eficazes as decisões adotadas pelas instituições de ensino superior no que respeita o seu trabalho acadêmico, normas, gestão e atividades relacionadas”.
Segundo eles, “trata-se de prevenir o que se prenuncia em escalada”. “As ditaduras e o autoritarismo se valem da violência, primeiro contra a palavra, a censura; depois contra o corpo, a tortura com banimentos, exílios e assassinatos políticos”, afirmam.
"Balbúrdia"
O bloqueio de 30% do orçamento das universidades federais ocorreu após o ministro da Educação, Abraham Weintraub, anunciar que as instituições que estiverem promovendo “balbúrdia”, eventos políticos e manifestações partidárias em seus campi e com desempenho abaixo do esperado terão a verba cortada. 
Em outubro de 2018, o Supremo Tribunal Federal referendou, na sessão plenária, liminar concedida pela ministra Cármen Lúcia na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 548 para assegurar a livre manifestação do pensamento e das ideias em universidades.
Em seu voto, seguido por unanimidade, a relatora salientou que os atos judiciais e administrativos questionados na ação contrariam a Constituição Federal de 1988 e destacou que a autonomia universitária está entre os princípios constitucionais que garantem toda a forma de liberdade.
A ADPF 548 foi ajuizada pela procuradora-geral da república, Raquel Dodge, contra decisões de juízes eleitorais que determinaram a busca e a apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas dependências das sedes de associações de docentes, proibiram aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política, impondo a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018 em universidades federais e estaduais.
As medidas teriam como embasamento jurídico a legislação eleitoral, no ponto em que veda a veiculação de propaganda de qualquer natureza em prédios e outros bens públicos
Clique aqui para ler a íntegra do manifesto.

Veja quem assina o manifesto: 

1 - Adelaide Albergaria Pereira Gomes
2  - Adriana Nogueira Vieira Lima
3 - Alberto Carvalho Amaral
4 - Alessandro Soares
5 - Alexandre Gustavo Melo Franco de Moraes Bahia
6 - Alexandre Bernardino Costa
7 - Alexandre Moura Dumans
8 - Alexandre Pacheco
9 - Alfredo Attié
10 - Aline Cristina Braghini
11 - Aline Tortelli
12 - Ana Amélia Mascarenhas Camargos
13 - Ana Inés Algorta Latorre
14 - Ana Maria de Barros
15 - Anderson Bezerra Lopes
16 - Andre de Oliveira Coelho
17 - André Karam Trindade
18 - André Luiz de Felice Souza
19 - Angela Couto Machado Fonseca
20 - Angélica Vieira Nery
21 - Angelita da Rosa
22 - Anna Candida Serrano
23 - Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay)
24 - Antonio Grillo
25 - Antônio Gomes Moreira Maués
26 - Antonio Pedro Melchior
27 - Antônio Sérgio Escrivão Filho
28 - Aparecida Zuin
29 - Argemiro Cardoso Moreira Martins
30 - Arnobio Lopes Rocha
31  - Artur Stanford da Silva
32  - Beatriz Vargas
33  - Bethania Assy
34  - Breno de Carvalho Monteiro
35  - Brunello Souza Stancioli.
36  - Bruno César de Caires
37  - Bruno Salles Ribeiro
38  - Carina Sedrez
39  - Carlos Eduardo de Melo Ribeiro
40  - Carlos Eduardo Machado
41  - Carol Proner
42  - Carolina Cyrillo da Silva
43  - Carolina Gabas Stucchi
44  - Carolina Porto Juliano
45  - Catarina Cardoso Sousa França
46  - Celeste Leite dos Santos
47  - Celso Antonio Bandeira de Mello
48  - Celso Fernandes Campilongo
49  - César Caputo Guimarães
50  - Cesar Pimentel
51  - Cezar Britto
52  - Christiano Fragoso
53  - Clara Moura Masiero
54  - Clarissa Machado de Azevedo
55  - Cláudia Roesler
56  - Claudio Roberto da Rosa Burck
57  - Cristina Ulm
58  - Cynthia de Lacerda Borges
59  - Daniel Von Hohendorff
60  - Daniela Muradas Antunes
61  - Daniela Teixeira
62  - Daniele Silva da Silva Gonzalez
63  - Diogo Bacha e Silva
64  - Douglas de Souza Lemelle
65  - Eder Bomfim Rodrigues
66  - Edson Ribeiro
67  - Eduardo Xavier Lemos
68  - Edvaldo Cavedon
69  - Eleonora Nacif
70  - Emília Teixeira Lima Eufrásio
71  - Emilio Peluso Neder Meyer
72  - Eneida Desirée Salgado
73  - Enzo Bello
74  - Érika Thomaka
75  - Ernesto Esteves
76  - Ernesto Tzirulnik
77  - Esmar Guilherme Engelke Lucas Rêgo
78  - Estela Aranha
79  - Estevão Rodrigo da Silva Stertz
80  - Fabiana de Menezes Soares
81  - Fabiana Marques
82  - Fabiano Silva Santos
83  - Fábio Gaspar
84  - Fábio Queiroz
85  - Fabrício Bertini Pasquot Polido
86  - Fernanda Freixinho
87  - Fernando Augusto Fernandes
88  - Fernando Haddad
89  - Fernando Neisser
90  - Fernando Tristão Fernandes
91  - Flavio Bastos
92  - Flavio Crocce Caetano
93  - Flávio José Moreira Gonçalves
94  - Flávio Martins
95  - Florian Fabian Hoffmann
96  - Gabriel Sampaio
97  - Gabriela Jardon
98  - Gabriela Shizue Soares de Araujo
99  - Geraldo Prado
100  - Gisele Cittadino
101  - Gisele Ricobom
102  - Gladstone Leonel Jr
103  - Glauco Pereira dos Santos
104  - Guilherme Lobo Marchioni
105  - Guilherme Scotti
106  - Gustavo Bussmann Ferreira
107  - Gustavo Filgueiras
108  - Heitor Cornachioni
109  - Helio Freitas C. Silveira
110  - Isabela Corby
111  - Ivan Santiago
112  - Izabel Nuñes
113  - James Walker Jr
114  - Janaína Penalva
115  - JeanFrançois Deluchey
116  - Jessica Ailanda
117  - Joana Loureiro Pedro de Souza
118 -  João Antonio Ritzel Remédios
119  - João Carlos Castellar
120  - João Ricardo Dornelles
121  - Joaquim Pontes de Cerqueira César
122  - Jorge Souto Maior
123  - José Augusto Rodrigues Jr
124  - José Carlos Moreira da Silva Filho
125  - José Carlos Tortima
126  - José Eduardo Martins Cardozo
127  - José Francisco Siqueira Neto
128  - José Geraldo de Sousa Jr
129  - José Roberto Xavier
130  - Josué Assunção
131  - Juarez Tavares
132  - Juliana Cardoso Ribeiro Bastos
133  - Juliana da Paz Stabile
134  - Juliana Nancy Marciano
135  - Juliana Neuenschwander Magalhães
135  - Juliano Breda
136  - Kátia Tavares
137  - Kenarik Boujikian
138  - Laio Correia Morais
139  - Lais de Figueirêdo Lopes
141  - Leandro Raca
142  - Leonardo Costa de Paula
143  - Leonardo Isaac Yarochewsky
144  - Letícia Lins e Silva
145  - Lívia Gimenez Dias da Fonseca
146  - Lívio Alves Araújo de Oliveira
147  - Luciana Boiteaux
148  - Luciana de Souza Ramos
149  - Luciana Lombas Belmonte Amaral
151  - Luciano Rollo Duarte
152  - Ludmila Cerqueira Correia
153  - Luis Carlos Moro
154  - Luis Flávio Biolchini
155  - Luis Guilherme Vieira
156  - Luísa Stein
157  - Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme
158  - Luzia Paula Cantal
159  - Magda Barros Biavaschi
160  - Magnus Henrique de Medeiros Farkatt
161  - Magnus Henry da Silva Marques
162  - Maíra Fernandes
163  - Marcello Oliveira
164  - Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira
165 .-..Marcelo Camara Py
166  - Marcelo de Carvalho
167  - Marcelo Maciel Ramos
168  - Marcelo Neves
169  - Marcia Dinis
170  - Marcia Maria Barreta Fernandes Semer
171  - Marcio Barandier
172  - Marcio Donnici
173  - Marcio Tenenbaum
174  - Marco Antonio Sousa Alves
175  - Marco Aurélio de Carvalho
176  - Marcus Giraldes
177  - Marcus Vinicius Gonçalves
178  - Margarete Gonçalves Pedroso
179  - Margarida Lacombe Camargo
180  - Maria Cristina Carrion Vidal de Oliveia
181  - Maria Fernanda Salcedo Repoles
182  - Maria José Giannella Cataldi
183  - Maria Rosaria Barbato
184  - Mariana de Siqueira
185  - Mariana Mazzini Marcondes
186  - Marina Chaves Alves
187  - Mario Schapiro
188  - Marthius Sávio Cavalcante Lobato
189  - Martonio Mont'Alverne Barreto Lima
190  - Mauricio Vasconcelos
191  - Mauricio Vasconcelos
192  - Maurides de Melo Ribeiro
193  - Mauro de Azevedo Menezes
194  - Michel Saliba
195  - Miguel Pereira Neto
196  - Misabel de Abreu Machado Derzi
197  - Ney Strozake
198  - Orlando Venancio dos Santos Filho
199  - Oscar Alves de Azevedo
200  - Otávio Espires Bazaglia
201  - Otavio Pinto e Silva
202  - Paula Raccanello Storto
203  - Paula Regina Gomes
204  - Paulo Giovanni de Carvalho
205  - Paulo Roberto Cardoso
206  - Paulo Teixeira
207  - Pedro Carriello
208  - Pedro Gomes Miranda e Moreira
209  - Pedro Henrique Mazzaro Lopes
210  - Pedro Martinez
211  - Pedro Scuro
212  - Pedro Serrano
213  - Peri Ramos
214  - Pietro Alarcon
215  - Priscila Escosteguy Kuplish
216  - Rafaela Azevedo de Otero
217  - Rafaela Azevedo de Otero
218  - Rafson Ximenes
219  - Raphael da S Pitta Lopes
220  - Raquel Bartholo
221  - Reinaldo Santos de Almeida
222  - Renan Gavioli
223  - Renata Possi Magane
224  - Renato César Cardoso
225  - Renato Chaves Ferreira
226  - Renato Duro Dias
227  - Ricardo José Gonçalves Barbosa
228  - Ricardo Nery Falbo
229  - Ricardo Tinoco de Goes
230  - Rita Matozinhos
231  - Roberta Amanajás
232  - Roberto A R Aguiar
233  - Roberto Kant de Lima
234  - Roberto Parahyba de Arruda Pinto
235  - Roberto Podval
236  - Rodrigo José dos Santos Amaral
237  - Rodrigo Machado Gonçalves
238  - Rogério Dutra dos Santos
239  - Ronald Barbosa
240  - Rose Carla Silva Correia
241  - Rubens Casara
242  - Sabrina Menezes Teixeira
243  - Samara Castro
244  - Sayonara Grillo
245  - Sergio Graziano
246  - Sheila Lustoza
247  - Simone Haidamus
248  - Sônia Maria Alves da Costa
249  - Soraia Ramos Lima.
250  - Talita Tatiana Dias Rampim
251  - Thiago Jordace
252  - Thomas da Rosa de Bustamante
253  - Tiago Botelho
254  - Valéria Teixeira Sous255  - Vitor Bartoletti Sartori
256  - Vítor Hugo Loreto Saydelles
257  - Vitor Marques
258  - Wagner Gusmão Reis Junior
259  - Waleska Mendes Cardoso
260  - Walfrido Warde Jr
261  - Wanja de Carvalho
262  - Weida Zancaner
263  - Willis Santiago Guerra Filho
264  - Wilson Ramos Filho
265  - Zéu Palmeira Sobrinho

quarta-feira, 1 de maio de 2019

Ministro da Educação deve ser enquadrado pelas violações administrativas, penais e constitucionais, afirma ex-reitor da UnB

Ministro da Educação deve ser enquadrado pelas violações administrativas, penais e constitucionais, afirma ex-reitor da UnB

Por João Negrão, da Editoria
O jurista José Geraldo de Souza Júnior, ex-reitor e professor daFaculdade de Direito daUniversidade de Brasília (UnB),afirma que o ministro da Educação,Abraham Weintraub, ao tentar enquadrar as universidades federais, comete um grave desvio de finalidade, ofende a Lei de Diretrizes e Bases da Educação(LDB) e a própria Constituiçãofederal, “no que toca ao princípio da autonomia e da liberdade de ensinar”.
O professor José Geraldo, que também é coordenador do Direito Achado na Rua, um grupo de pesquisas da Faculdade de Direito, também analisa o atual momento político que o país atravessa e faz uma comparação com os tempos de hoje e os da época do regime militar instaurado em 1964, quando as universidades públicas foram um dos principais alvos do arbítrio.
Ele falou com exclusividade para a comunidade da Agência RBC News. Confira a entrevista:
Primeiramente, gostaria que o senhor falasse sobre essas investidas do novo ministro da Educação. Ao falar em reprimir “balbúrdias” ele quer estabelecer um controle sobre as universidades, desrespeitando a autonomia? Declara que vai vigiar as atividades das instituições de ensino superior?
Professor José Geraldo – Penso que é um grave desvio de finalidade, é uma ofensa direta à Lei de Diretrizes e Bases da Educação [LDB] e a própria Constituição Federal, no que toca ao princípio da autonomia e da liberdade de ensinar. No primeiro caso, com motivação imprópria – reprimir balbúrdia – incide em responsabilidade, considerando a exigência de adequada fundamentação do ato, que deve respeitar a impessoalidade, a transparência e a legalidade e não a objeção difusa de politização. Veja-me o artigo. 37 da Constituição Federal. No segundo caso, com ofensa também às normas convencionais – Convenção Americana – imiscuindo-se no âmbito da autonomia. Em época recente, por essas mesmas razões representei contra o ministro da Educação na PGR [Procuradoria Geral da República] e na Comissão de Ética Pública [da Presidência da República]. Agora vejo que um deputado indica que vai entrar com ADPF (Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental) diretamente no STF [Supremo Tribunal Federal]. Somente entidades nacionais podem fazê-lo, no caso partido. Mas espero que a ANDIFES [Associação Nacional de Dirigentes e Instituições Federais de Ensino] também o faça, porque a ameaça é a todo o sistema universitário federal.
O que esperar dessa ação?
Professor José Geraldo – Espero que a ação enquadre o ministro pelas violações administrativas, penais – reter recursos orçamentários aprovados em lei federal para fins legais – e constitucionais, com a consequente responsabilização.
Por que a UnB é uma das principais atacadas?
Professor José Geraldo – Acho que a UnB, historicamente, por sua origem e compromisso estatutário, é uma referência para a salvaguarda do espaço autônomo da liberdade de ensino é de pensamento. E por isso, historicamente, tem sido o alvo de toda a tentação autoritária. Sendo a universidade da capital, próxima à cidadela do poder, passa a ser o efeito demonstração do programa autoritário, que responde a uma lógica econômica: mercadorizar a educação e privatizar o patrimônio público. Foi assim em 65, 68, 77 e 85. Basta ler o relatório da Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade da UnB.
O senhor acha que, como nessas cinco tentativas na ditadura militar de enquadrar a UnB, haverá resistência?
Professor José Geraldo – Penso que sim. Externa e internamente. Mas também acho que há um tanto de diversionismo nessa manobra. O neoliberalismo quer abocanhar a reserva de serviços que a educação proporciona, precisa ajustar a formação de quadros ao seu programa ideológico, mas espera levantar no momento muita fumaça nesse terreno para reduzir a atenção ao front da reforma da Previdência. A UnB tem se mostrado atenta nos dois cenários e saberá resistir política e juridicamente.
Mas para finalizar, gostaria que o senhor traçasse um paralelo entre o que foi a ditadura militar nos ataques à Educação, especialmente às universidades, e, em particular a UnB, e agora este governo Bolsonaro, com toda a sua carga de atraso e combate ao pensamentos libertários do ambiente universitário.
Professor José Geraldo – Em toda ação política autoritária logo se instala o horror à crítica e à reflexão, muito fortes no ambiente cultural e na educação. Pense em Goelbbes e seu horror à cultura que lhe dava o desejo de empunhar a pistola. E em Mussolini, ao afirmar em seguida a condenação de Gramsci que era preciso fazer aquele cérebro parar de pensar por 20 anos; E na funesta procissão das tochas na Alemanha nazista, culminando com a queima de livros de Filosofia, de Sociologia e de Literatura. As ditaduras e o autoritarismo se valem por isso da violência, contra a palavra, a censura; contra o corpo, a tortura; contra o protagonismo político, o banimento, o exílio e o assassinato político. Entre a ditadura explícita e a mobilização autoritária que a prepara, essa gradação vai se delineando, como estamos assistindo. Há poucos meses na UnB, livros de Sociologia, de Filosofia, de religião e de direitos humanos sofreram vandalismo. Na própria UnB, há dias, professores e principalmente professoras, foram ameaçados. Na Faculdade de Direito esse processo está sob apuração da Polícia Federal, mas já há docente em sistema de proteção e outras que renunciaram a seus cargos. No momento ainda parece ser algo que germina difusamente, num fascismo social, mas já se manifesta numa parte do discurso de governo sob a forma de uma postura anti-intelectualista e anti-cultural, mas que já se amplia para a institucionalidade, como agora, nessa ação do Ministro da Educação. Se não for posto cobro a isso, é uma ADPF pode ser o caminho, o fascismo social se transformará em fascismo institucional e o autoritarismo em ditadura.