O Direito Achado na Rua: nossa conquista é do tamanho da nossa luta

sexta-feira, 12 de julho de 2019

Roberto Aguiar: exemplo, luz, ideias, feitos, que marcaram e inspiraram muitas pessoas, contribuindo de modo intenso para suas trajetórias de vida

José Carlos Moreira Silva Filho
Zk Moreira está com Mauro Noleto e outras 5 pessoas.
Como se não bastasse as tristezas políticas e sociais do nosso país, além das mortes recentes de pessoas valorosas, hoje acaba de se ir mais uma dessas pessoas, o querido e único Roberto Aguiar. Foi meu professor na UnB, inspirou fortemente a minha geração e tantas outras nos caminhos do pensamento crítico no Direito, na ação e no pensar voltados para uma sociedade mais justa, igualitária e democrática. Participou do projeto "O Direito Achado na Rua", no vídeo, nos livros, no curso. Escreveu obras que marcaram profundamente a minha vida de estudante de Direito de um Brasil recém democratizado e com uma Constituição cidadã que ainda engatinhava: "A Crise da Advocacia no Brasil", "Direito, poder e opressão", "O que é justiça", "Os militares e a Constituinte". Além das aulas, foram inúmeras as palestras que tanto nos inspiraram, em diversos encontros e congressos de Direito Brasil afora, sempre na perspectiva de um Direito voltado para combater a desigualdade social, para buscar a emancipação da nossa sociedade e desse povo tão sofrido e tateante.
Fui apresentando ao Roberto pelo meu querido mestre e orientador José Geraldo Sousa Junior. Ficamos amigos no ato. Para além das aulas e grupos de estudo, lembro-me que o Roberto conseguiu um estágio para mim e para o parça Mauro Noleto no Conselho Federal de Medicina, onde aprendemos muito sobre os processos do Comitê de Ética, cujos relatórios tínhamos de preparar. Não imaginava que havia tanta medicina mal praticada e criminosa no país, quase sempre presente nos bairros mais pobres.
Estudante recém formado em Direito, com ainda inseguros e incertos vinte e um anos, fui fazer a seleção para o mestrado em Direito da UFSC. Na entrevista é que soube, pela fala do professor que presidia a banca, o Prof. Leonel Severo Rocha, que o Roberto Aguiar havia me recomendado para o programa, atestando meu perfil e capacidade para integrá-lo como aluno. Jamais me esqueci deste gesto de atenção e carinho.
Depois, já professor no PPGD da UNISINOS, chamei o Roberto para uma banca de mestrado, que ele fez junto com o amigo Lenio Luiz Streck. Em seguida ele deu uma bela palestra no Auditório Maurício Berni.
Em Brasília chegamos a ser colegas na Comissão de Anistia, ele ainda permaneceu por algum tempo, logo após a nova gestão e os novos Conselheiros e Conselheiras terem assumido, no longínquo e afortunado ano de 2007. Ali pude desfrutar um pouco mais da sua luminosa companhia. Em uma das minhas idas à Brasília tive a sorte de poder prestigiá-lo na solenidade em que recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela UnB. Também estive na sua casa, tomei um café, conversei sobre possíveis projetos futuros, com ele e com a querida Wanja, agora sua viúva, pessoa maravilhosa, humana e destemida. Desde esse encontro ficou uma promessa não cumprida de ir visitá-lo novamente.
Creio que a última vez em que o vi foi em 2016, quando Dilma estava prestes a ser afastada e depois deposta. Houve no Palácio do Planalto uma solenidade de apoio dos juristas democráticos a então Presidenta. Todos ali sabiam muito bem que estava sendo aberta a caixa de Pandora e que o golpismo voltava a ditar os rumos do país. Lá estava o Roberto, todo arrumado com seu terno e com seu olhar de garoto.
Sim. O Roberto tinha um olhar de garoto. Um par de olhos azuis bem abertos, intensos, irrequietos, denunciando seu pensamento de vanguarda, seu vigor, sua força, sua alegria, pois o sorriso sempre seguia esses olhos, e era algo inevitável a sensação de bem-aventurança por poder desfrutar de uma companhia assim.
Juntamente com a Beatriz Vargas Ramos, a Wanja e o Alexandre Bernardino Costa, estávamos pensando, desde 2017, em fazer um evento na UnB em homenagem a este grande homem, mas a limitação de verbas para a Universidade já era uma realidade que nos impedia de avançar. Quem sabe conseguimos fazer algo agora. Pena que será póstumo.
Roberto, querido amigo, segue em paz, esteja certo de que o seu exemplo, a sua luz, as suas ideias, os seus feitos, marcaram e inspiraram muitas pessoas, contribuindo de modo intenso para suas trajetórias de vida, e entre estas eu me incluo. Obrigado. Sempre.

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