O
Direito Achado na Rua e a eleição para Reitora da UnB
Então!
Li atentamente o texto do professor Rodrigo de Faria em que, nalguma medida,
faz um ataque ao Direito Achado na Rua. Li também atentamente o texto do
professor José Geraldo de Sousa Junior (“causador” da ágora pós-eleitoral na
UnB). Destas mensagens balizadoras (ou preparatórias), passo à minha modesta
opinião, que se faz, com a devida vênia, uma retratação ao Direito Achado na
Rua, seu Coletivo de Pesquisadoras/res, assim também um de seus mentores, o
próprio Zé Geraldo.
Confesso
que me assustei com a escolha da premissa pelo professor Rodrigo de que o seu
colega de trabalho e sonhos, José Geraldo, estaria a “deslegitimar” o voto e a
participação de certos eleitores/segmentos a partir do que consta exatamente
como último parágrafo no texto do Zé no jornal “Brasil Popular”. Resumo com
suas próprias palavras na mensagem que me enviou enquanto debatíamos outras
necessidades no mundo (e foi como tive acesso ao texto, em PDF e assinado, de
Rodrigo de Faria). Disse-me o Zé: “Aproveito para compartilhar um texto curioso
produzido no calor da campanha, ingênuo, equivocado e injusto”… complemento:
“imprudente”!
Acusas
o professor ofendido o José Geraldo de algo que ele mesmo cometeu como
contra-argumentação: deslegitimar o seu oponente temporário.
Fazendo,
com o reiterado respeito, uso das palavras do próprio Rodrigo, “lamentavelmente
o que essa deslegitimação construída com vocabulário erudito” pretendeu foi: i)
desabafar diante da discordância de ter visto – talvez um “ídolo” seu da
Academia – o Zé Geraldo apoiando uma chapa que não fosse a sua; ii) extravasar
o estresse que é muito comum em engajamentos de uma determinada campanha
política (e para isso, escolher um “alvo”, normalmente, alguém com chancela e
potência no enlace da disputa); e/ou iii) chamar a atenção (isto é, buscar
holofotes) para a continuação da campanha, ainda que fazendo uso de métodos
estranhos ao que se esperaria de um (ex-) aliado. Em todo caso, não passa de um
esforço retórico para, aí sim, tentar deslegitimar o debatedor que houvera
proposto outra premissa.
Mas
é fundamental que analisemos o conteúdo dos dois textos (ex)postos ao público.
No primeiro[1],
do Zé Geraldo, o que vemos é uma longa narrativa acerca do legado da UnB por
suas interfaces de participação (construção e resistência histórica)
democrática. Isto é, uma Instituição que foi se aprimorando na moldura da
convocação de sua comunidade e de toda a sociedade quanto ao exercício
democrático. Contudo, o texto também denota o risco de que, nos tempos de hoje,
onde ainda cheiramos o chorume do fascismo, as pessoas (legitimados do processo
eleitoral e do processo de significação da Universidade), ou não queiram mais
participar, ou participem de forma enviesada. Sim, ou estão desacreditados do
processo político nas várias esferas, ou acreditam, mas a partir de fábulas e
falácias que forjam uma pós-verdade à Instituição e sua gente.
O
texto do professor Zé Geraldo pontua as gigantes características das
concorrentes, especialmente no louvor a que, nesta disputa, por sorte da
democracia, integralmente se tratam de candidatas, avocando para a história o
lugar que sempre deveria ter sido de legitimidade política das mulheres. Óbvio,
“puxa a sardinha” um pouco mais para a sua candidata, a professora Olgamir
Amancia Ferreira, mas isso é do jogo democrático: se se tem um lado no processo
e se se tem o espaço de fala, uma “boca de urna” é sempre bem-vinda! Claro, no
respeito ao tabuleiro limpo para uma justa partida do xadrez eleitoral.
Imprudente
ou maquiavelicamente, o professor Rodrigo pegou a última sentença do último
parágrafo para tentar desacreditar o texto de seu adversário pró-tempore.
Entretanto, comete duas potentes incoerências. A primeira é que “entende mal” a
colocação do professor José Geraldo que não estava a prover uma crítica
negativa aos servidores técnico-administrativos, contudo, a realizar uma
constatação e que, por si mesma, não é ilegítima: de que estes levam às
candidatas (e, veja, não é apenas para uma candidata, mas todas) as suas
“pautas e suas expectativas”, que podem ou não ser classistas ou de qualquer
outro interesse legítimo. A segunda é que não há uma honestidade intelectual em
trazer, pelo menos deste último parágrafo do texto do Zé Geraldo, o restante de
suas mobilizações e inquietações ao segundo tempo do “jogo”, isto é, para a
continuação do pleito eleitoral. A este respeito, leiamos todo o parágrafo do
artigo do emérito da UnB para tirarmos todas as nossas conclusões e mais
algumas – honestas:
“Convicto
da legitimidade do processo o que estou pondo em causa, à luz do fecho do
primeiro turno, é que se abra uma perspectiva avaliativa sobre as exigências
pedagógicas para superar essa distância de participação e de engajamento, no
intento de buscar formas pedagógicas para maior intensificação desse processo,
no geral, e pensando também o segundo turno, ainda num período de alto
esvaziamento da universidade pelas circunstâncias de diferentes posicionamentos
no movimento de greve, com alunos e professores entre os que já encerraram as
suas atividades acadêmicas e um segmento presente na sua totalidade, os
servidores, muito determinados em inserir suas pautas e suas expectativas
corporativas na agenda de compromissos das candidaturas. Mais que nunca o
debate se faz necessário e é importante proporcionar as condições para que ele
seja promovido.”
Quanto
ao texto do professor Rodrigo[2].
Magistral quanto ao acervo e aos sofismas, entretanto, dúbio quanto ao escopo.
Enaltece a grandeza da corrente epistemológica do “Direito Achado na Rua”,
contudo, personifica em apenas uma pessoa (embora seja o líder maior da
corrente) todo um Coletivo de sujeitos elaboradores/as das postulações teóricas
desta ciência social. Isto é, confunde o Direito Achado na Rua com o próprio
professor José Geraldo (uma espécie de metonímia cínica). Reiteramos: embora o
Zé Geraldo seja seu maior formulador, não se pode deslegitimar o Direito Achado
na Rua por uma suspeita de – quem sabe – existir algum dia uma incongruência do
professor. Dizer, logo no título do comunicado à comunidade universitária e em
outras instâncias do texto que esta corrente é o “Direito ‘Perdido’ na Rua” é
fazer um deselegante e injusto trocadilho. Destarte, aparenta má-fé, ou
proximidades aos métodos sujos visto na atual política, especialmente da
extrema-direita, que dissimula o conteúdo e as regras.
Há
no texto do Rodrigo um manancial de elogios, tanto ao professor José Geraldo,
quanto à sua história e também ao Direito Achado na Rua. Há uma certa nostalgia,
além de uma implícita poesia destas três dimensões quanto ao que o Rodrigo
afirma ser um tempo de “(re)construção” da UnB, uma universidade pulsante,
vibrante que passou por uma transição tempos atrás e teve no Zé Geraldo e
outros atores de ideal um divisor de águas. Entretanto, embora reconheça tudo
isso, o “calor” da atual eleição (consulta) para Reitora mexeu tanto com os
nervos do professor Rodrigo que ele prefere apagar toda esta riqueza para, de
alguma forma, difamar (se preferimos um eufemismo: deslegitimar) o seu colega,
José Geraldo.
Em
tempos em que as polarizações são burras; tempos “à flor da pele”, o debate não
parte apenas de premissas erradas, todavia, de desentendimento (enviesamento)
das premissas e das verdades que exigem a pura democracia.
Para
dar um melhor lugar a esta resposta ao professor Rodrigo e a todos que desejem
com ele concordar (sem uma justa e honesta interpretação do texto do Zé
Geraldo), deixo claro que o Direito Achado na Rua defende exatamente o que um
de seus mentores quis dizer naquele texto. Ao dissertar, entre outras
premissas, o seguinte: “considerei que, ao avizinhar-se uma nova troca de pele,
com a UnB entrando“em processo de
consulta para a escolha de um novo reitor. Será uma reitora. Três mulheres,
nutridas pelo ethos do generoso projeto que formou a UnB. Todas leais aos seus
princípios, numa garantia de que não haverá traição à concepção dessa bela
utopia acadêmica. Saudável exercício democrático-universitário que se fixará
nas distinções sutis das propostas, a qualificação das associações que as
pretendam realizar, a correspondência entre discursos, experiências e
práticas”, está a guardar os pressupostos da corrente teórica que ajudou a
criar e catapultar para o Brasil e para o mundo. E elucidamos mais, o Coletivo
do Direito Achado na Rua defende como princípios de uma nova sociedade, a
emancipação dos sujeitos, neste particular, daqueles que historicamente foram
oprimidos, espoliados e/ou vulnerabilizados, a decolonização das estruturas e
das instituições, os direitos humanos, a justiça de transição e a democracia.
São pilares inegociáveis para o Coletivo e estão implícitos (quando não,
explícitos) no texto do Zé Geraldo a tratar de UnB e Eleição para Reitora.
Na
síntese: embora extremamente injusto tenha sido o professor Rodrigo diante das
suas palavras ao professor José Geraldo (e ao lado por este escolhido na
Consulta da UnB), ainda que pareça incoerência, ficarei com ele mesmo escreveu
no último parágrafo de seu destrato: “Esse sim é o ‘Direito Achado na Rua’ que
continuarei acreditando. É preciso enfrentar politicamente essa estratégia
político-eleitoral caracterizada pelo binômio deslegitimação/difamação (…)”. E
o restante do parágrafo, assim como as crenças e manifestações do professor, é
de foro íntimo. Prefiro – no que ele se irrompe no texto – não concordar!
Marconi Moura de Lima Burum
Aluno da pós-graduação em Direitos
Humanos e Cidadania (PPGDH/CEAM/UnB) e Pesquisador do Grupo de Pesquisa O
Direito Achado na Rua
[1] Para confirmação do conteúdo, segue o link
do texto do professor José Geraldo: A
UnB e a Escolha de Novo(a) Reitor (a): Um processo com a participação da
comunidade acadêmica - Brasil Popular.
[2] Infelizmente não consegui encontrá-lo
publicado na internet. Deve existir algum blog ou página outra que o tenha
difundido. Terão de buscar em grupos de Whastsapp da UnB – que, por certo, está
cumprindo seu papel de viralizar, mesmo prejudicando o contraditório por falta
de uma ágora equitativa ao debate.
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