DISCURSO
PATRONO –DA TURMA DE FORMANDAS E FORMANDOS NO 1º SEMESTRE DE 2023
FACULDADE
DE DIREITO – UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
Professor
Antonio Sergio Escrivão Filho
ILUSTRÍSSIMA SENHORA
DIRETORA DA FACULDADE DE DIREITO – PROF. DANIELA MARQUES
ILUSTRISSIMA
COORDENADORA DO CURSO – PROF. FERNANDA LAGE
ILUSTRISSIMA COLEGA
PRATRONESSE – PROF. GABRIELA NEVES DELGADO
ILUSTRISSIMOS PROFESSOR
E PROFESSORA HOMENAGEADOS – PROF. MENELICK DE CARVALHO NETO E PROF. RENATA
DUTRA
ILUSTRES FAMILIARES,
AMIGAS E AMIGOS,
ILUSTRES, QUERIDAS E
QUERIDOS FORMANDOS
--
É
com o coração mais vasto que o mundo, pleno de sentimentos e sentidos
recolhidos e em alguma medida compartilhados com vocês em sala de aula, que lhes
devolvo neste momento algumas palavras para que enfim possamos seguir os
caminhos e perseguir os projetos de vida e de sociedade que inspiram a cada uma
e cada um de nós.
Talvez
como diria o poeta pernambucano, na noite de hoje, ao dar o primeiro passo
despedindo-se aqui de Athos Bulcão, o mundo terá saído do lugar. Serão poucos
os momentos na vida em que isso ocorrerá de maneira tão intensa e até literal.
O
protocolo é de colação (de grau), mas o momento é de intensos deslocamentos dos
sentidos, do papel, da importância e do ato potência que vocês passam a
representar nas suas próprias vidas; nas vidas daquelas e daqueles que amam e
por quem são amados; e ao mesmo tempo, como não haveria de ser diferente, na
vida da nossa sociedade.
A
partir daqui, ou melhor, partindo daqui, deste tempo-espaço de celebração de
uma conquista que é indistintamente individual e coletiva, nada fica para trás.
O instante que era futuro ao entrar por aquela porta já se realizou. O
horizonte do Direito, avistado ao ingressar na Universidade de Brasília,
continua lá, à mesma distância, mas agora vocês lançam para ele uma mirada como
quem o conhece. E são poucos, é bem verdade. O que só faz aumentar a potência
individual, e a responsabilidade social, com as quais vocês continuarão a
caminhar a partir daqui. A partir de então.
Então
vocês me convidaram, e assim convocaram, provocaram algumas reflexões que
aparecem no horizonte do Direito neste tempo de homens partidos. Nosso tempo
como no poema de Drummond.
Desde
o ingresso até este momento de partida, muitos se partiram. Mundos se partiram.
Durante aquele longo que agora já é breve período de graduação vocês
vivenciaram com a sociedade brasileira e internacional eventos historicamente
emblemáticos, e dramáticos. A sociedade foi intensamente impactada, e por via
de consequência, o Direito.
Como
diria Roberto Lyra Filho, um dos expoentes desta eminente Faculdade, o direito
é processo, dentro do processo social. E como processo, ele está em constante
vir-a-ser. Vocês também estão.
Aquela
mirada para o horizonte no ingresso da Faculdade de Direito vos fez chegar até
aqui. Verdadeiro momento constituinte, que recolhe uma intensa experiência
revolucionária nos modos de ser e de viver de cada uma e cada um de vocês.
Verdadeiro
momento constituinte que partindo desta revolução em suas vidas, se projeta
agora para o futuro, com novas perspectivas de ser e se encontrar consigo
mesmo, com a sociedade e com o direito. Por isso me permitam avançar dizendo o
seguinte.
A
escolha que vocês fizeram pelo Direito constitui agora em vocês um poder, que
carrega consigo uma mesma e exata medida de responsabilidade. Ao sair por
aquela porta e se despedir da graduação em Direito, vocês estarão autorizadas e
autorizados pela sociedade para, constituindo um grupo bastante seleto, e
finalmente diverso, exercer uma profissão jurídica, e praticar o Direito.
Neste
ano em que a política de ações afirmativas completa 10 anos no Brasil,
inaugurada e alavancada pela Universidade de Brasília, sabemos já que esta
diversidade se projeta no horizonte como um dos elementos de maior impacto na
realidade do direito. Tardou, mas o horizonte agora é, ao menos, avistado.
Ainda temos muito que caminhar. Caminhar na universidade, caminhar na rua.
Como
diria o poeta Cassiano Ricardo, a rua onde cada um de nós é um pouco mais dos
outros do que si mesmo. A rua da transformação social, onde mora o
acontecimento.
Ao
sair por aquela porta, a rua, a universidade e o sistema de justiça vos esperam.
“Cê
vai, ocê fique, você nunca volte!” Ao colocar estas palavras na boca da mulher
que vê o seu marido partir rumo à terceira margem do rio, Guimarães Rosa sugere
com impressionante síntese poética que a partida possui algo de existencial.
“Cê vai”, mas para onde? “Ocê fique”, mas se decida. “Você nunca volte”, pois a
partir de agora já é outro, e ao retornar, marcado pelas tuas escolhas, talvez
eu já não lhe reconheça mais.
A
pergunta é difícil, mas, para onde pretendem ir, com o Direito?
Ao
sair por aquela porta, vocês estarão autorizados ao exercício de uma profissão
jurídica. É verdade que outras esfinges ainda lhes desafiarão neste percurso,
mas ao menos sabemos que o primeiro passo foi dado, e para vocês, o mundo do
Direito lá fora saiu do lugar.
Estão
autorizadas e autorizados a intensificar seus passos na prática do Direito. Autorizada,
é aquela pessoa dotada de autoridade. Autoridade, é um atributo daquela ou
daquele que exerce um poder.
A
pergunta é difícil, mas para onde pretendem ir com este poder?
A
propósito, parece oportuno lembrar das nossas conversas em sala de aula.
Estabelecer limites para o exercício da autoridade, e materializar o poder de
dizer o que ela já não pode fazer, são características genéticas e também
cotidianas dos direitos humanos.
Então
vou encerrar, a partir desta relação entre o direito como fator de limitação ao
exercício do poder da autoridade.
Manejar
o direito com prudência, com atenção aos limites ético-jurídicos que a noção de
dignidade humana venha nos informar. A todo momento. Agora e agora de novo. Na
conformação de contratos internacionais, ou na promoção de causas sociais. No
exercício da jurisdição, na sua assessoria, ou na materialização do direito de
petição. Na mobilização pública da máquina judicial, ou na defesa individual.
Mas
o nosso tempo também me mobiliza a falar de outros limites.
Em
tempos de internet, trabalho digital, mundo virtual, as demandas chegam por
diferentes canais, e são expiradas por todos os poros. É tempo de respeito, e
cuidado. Com o outro, e com o Eu.
A
sociedade digital vem forjando formas de trabalho que há muito já desafiaram os
limites do espaço e do tempo. O cansaço físico deu lugar ao esgotamento
psíquico e mental. Por algum motivo perdemos a capacidade de delimitar e
distinguir o que é trabalho, o que é descanso, o que é importante, o que é
necessário. O que tem valor, o que tem amor, o que é lazer, o que é prazer.
Então
eu peço que tenham cuidado, e respeito. Pelos outros, e por vocês. Sabemos que na
sociedade digital perdemos a capacidade de nos despertar para o risco de ser
cada dia mais motivado e exigente, com os outros e com nós mesmos. Não se trata
somente de excesso, mas um excesso de positividade.
Então
estudem, ambicionem, trabalhem, definam e alcancem as suas metas. Mas tenham
cuidado. Cuidado e respeito. Com os outros, e consigo mesmo. Não queremos que
como o jardineiro do Senhor Keuner, vocês almejem com afinco atribuir ao
arbusto uma forma de esfera, mas ao finalmente se deparar com a esfera, já não tenham
mais um arbusto para desfrutar.
Então
é hora de partir. Repartir. Compartir.
Compartilhei
com vocês a sala de aula, e agora compartilhamos todo o mundo fora dela! Sejam
bem vindos!
O
Direito se avizinha no horizonte. Não é mais o mesmo. Não é mais aquele, mas
cheio de expectativas vos espera.
E
eu tenho confiança de que ele estará agora em boas mãos.
Parabéns
a todas e todos, e muito obrigado!
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