O Direito Achado na Rua: nossa conquista é do tamanho da nossa luta

quarta-feira, 3 de março de 2021

 

Por Que Ler os Clássicos

Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito.

 

 

 

 

Italo Calvino. Por Que Ler os Clássicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1ª edição, 1993, 279 p.

 

            “Os clássicos são aqueles livros dos quais, em geral, se ouve dizer: ‘Estou relendo…’ e nunca ‘Estou lendo…”. Este é o ponto de partida dessa obra insuprimível na formação de qualquer intelectual, acadêmico ou mesmo diletante.

            Aliás, é com essa definição, a primeira dentre algumas propostas, que o autor Ítalo Calvino, abre o livro. Com efeito, nessa abertura ele oferece e discute 14 diversas propostas de definição, para trabalhar a questão que é a matéria do livro Por que ler os clássicos.

            Seguem-se: 2. Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado; mas constituem uma riqueza não menor para quem se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-los; 3. Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se impõem como inesquecíveis e também quando se ocultam nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual; 4. Toda releitura de um clássico é uma leitura de descoberta como a primeira; 5. Toda primeira leitura de um clássico é na realidade uma releitura; 6 Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer; 7. Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (ou mais simplesmente na linguagem ou nos costumes); 8. Um clássico é uma obra que provoca incessantemente uma nuvem de discursos críticos sobre si, mas continuamente as repele para longe; 9. Os clássicos são livros que, quanto mais pensamos conhecer por ouvir dizer, quando são lidos de fato mais revelam novos, inesperados, inéditos; 10. Chama-se de clássico um livro que se configura como equivalente do universo, à semelhança dos antigos talismãs; 11. O ‘seu’ clássico é aquele que não pode ser-lhe indiferente e que serve para definir a você próprio em relação e talvez em contraste com ele; 12. Um clássico é um livro que vem antes de outros clássicos; mas quem leu antes os outros e depois lê aquele, reconhece logo o seu lugar na genealogia; 13. É clássico aquilo que tende a relegar as atualidades à posição de barulho de fundo, mas ao mesmo tempo não pode prescindir desse barulho de fundo; 14. É clássico aquilo que persiste como rumor mesmo onde predomina a atualidade mais incompatível.

            Cada um de nós já terá, certamente, experimentado em nosso percurso cultural formativo, um ou outro sentimento ou apelo que essas definições sugeridas por Calvino a propósito dos clássicos, nos provocam. Trata-se, em certa medida, daquele atributo, designado por Werner Jaeger, em sua monumental Paidéia – a formação do homem grego, como cultura, enquanto totalidade das manifestações e formas de vida que caracterizam um povo, em última análise, um humanismo pois alude à formação do homem e da sua vida inteira, em Jaeger, algo que brota da consideração não do homem genérico na sua validade universal e normativa, mas da intersubjetivação do individual ligando-se a sua projeção civilizatória como ideia.

           Talvez seja exatamente no trânsito desse percurso que tome forma a substância das metáforas. Algo assim como transpor em mergulhos no tempo o Rio Meandro, descrito nos clássicos porque topônimo de sua incrível sinuosidade e logo projetando-se como linguagem nos meandros da existência. Ou para desentranhar do emaranhado das ideologias jurídicas as armadilhas das reduções juspositivistas e jusnaturalistas, sendo Hegel para divisar as sutilezas da ação trágica em Antígona (Estética, Fenomenologia do Espírito) que depois permitiriam a Roberto Lyra Filho revelar na infradialetização tridimensional de Miguel Reale a sua verdadeira face de Creonte (LYRA FILHO, Roberto. O que é Direito. São Paulo: Editora Brasiliense. Coleção Primeiros Passos, 1ª edição, 1982). Ou, com a epistemologia transgressora de Boaventura de Sousa Santos, poder emergir com Alice (SOUSA SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela Mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade. Porto: Edições Afrontamento, 2ª edição, 1994), que não mais se deixasse conduzir por meio de representações simbólicas de um mundo contemplado por Alice de mãos dadas com Kafka (APOSTOVA, Bistra Stefanova. Amnésia in juris. Revista do SAJU. Serviço de Assessoria Jurídica Universitária vol.2, nº 1. Porto Alegre: UFRGS, 1999, p. 89-96).

           Junto aqui Jaeger e Calvino, porque em ambos há esse apelo à educação clássica, no sentido do pensar e do agir humanos na modelagem do mundo. Jaeger, lembrando Fênix, educador de Aquiles, assinala a lição dada ao herói-protótipo dos gregos, sobre a importância de educar-se para proferir palavras e realizar ações.

            Calvino tem me acompanhado, com o apoio de seus textos brilhantes, em várias passagens distribuídas nesta Coluna Lido para Você. Conforme os temas, já me vali de seus As cidades invisíveis, Os amores difíceis. Suas Seis propostas para o próximo milênio, também conhecidas como lições americanas, conjunto do que deveriam ser, conforme o projeto, seis palestras que seriam proferidas na Universidade de Harvard em 1985 (um programa de visitas de grandes intelectuais. Em 1993, o visitante foi Umberto Ecodo que resultou a obra Seis passeios pelo bosque da ficção) mas o autor faleceu repentinamente antes de escrever a sexta conferência, sobre a consistência, e antes de proferir as palestras, que foram publicadas postumamente, em 1988enfocando temas paradigmáticos para o milênio (2000), e que me têm sido referências para me situar no tempo, a leveza, a rapidez, a exatidão, a visibilidade e a multiplicidade.

            Com ele, sobretudo neste Por que ler os clássicos, tenho constatado essa continuidade cultural que quase se aproxima do que, na filosofia com Platão e os neoplatônicos, pode-se compreender o que Jung definiu como arquétipo, conjuntos de imagens psicoides primordiais que dão sentido aos complexos mentais e às histórias passadas entre gerações, formando o conhecimento e o imaginário do inconsciente coletivo; agem como estruturas inatas, imateriais, com que os fenômenos psíquicos tendem a se moldar, e servem de matriz para a expressão e desenvolvimento da psique (https://pt.wikipedia.org/wiki/Arqu%C3%A9tipo).

              Sempre me impressionou, na minha vivência nordestina, encontrar nas grandes feiras – Caruaru, Caicó – as coleções de cordéis, sobretudo nas composições de Leandro Gomes de Barros dos dois “épicos” da Literatura de Cordel – Batalha de Oliveiros com Ferrabrás e Prisão de Oliveiros e de João Melchíades Ferreira com “Roldão no Leão de Ouro” e Antonio Eugênio da Silva com a “História do Principe Roldão”.  Não fora a explicação de Câmara Cascudo (que também já esteve nessa coluna Lido para Você), e eu jamais compreenderia a presença do rei Carlos Magno e seus cavaleiros, os doze pares de França liderados por seu sobrinho Rolando, para além da edição de 1516, do poema Orlando Furioso escrito por Ludovico Ariosto, o maior poeta italiano do romance de cavalaria. Sem falar no Castelo de Engady, que visitei em Caicó, no Rio Grande do Norte, construído pelo Monsenhor Antenor Salvino de Araújo, para ser um local de recolhimento, estudos, meditação, tal como a fonte de Engady, na Palestina foi nos tempos bíblicos o local de sossego e de proteção de Davi, perseguido pelo rei Saul.

            Em todo caso, aqui pertinho de Brasília, na cidade de Pirinópolis, Goiás, os pares de Carlos Magno continuam a enfrentar, agora os mouros, nas Cavalhadas de Pirenópolis após a Festa do Divino Espírito Santo, com seus exércitos contendo doze cavaleiros cada, em batalhas acirradas durante três dias.

Em Calvino trata-se, afinal, de considerar que os clássicos servem para entender quem somos e aonde chegamos… devem ser lidos (não) porque ‘servem’ para qualquer coisa, mas porque vale à pena: citando Cioran: enquanto era preparada a cicuta, Sócrates estava aprendendo uma ária com a flauta. ‘Para que lhe servirá?’, perguntaram-lhe. ‘Para aprender esta ária antes de morrer’. E também para descobrir esse novelo de Ariadne que nos liga entre nós, os humanos.

            Na coluna (http://estadodedireito.com.br/comunicacao-e-musica/), citando expressamente Por que ler os clássicos, anoto que Vicente Celestino certamente, sem ter lido  Howard Fast (Espártaco. São Paulo, Abril Cultural, 1976), jamais suspeitou que o mote de sua canção (Coração Materno) já circulava nas lendas de uma antiguidade europeia, anterior a era cristã. Na narrativa romanceada da grande guerra servil, 71 a. C., o autor surpreende personagens em volta a uma fogueira, recuperando histórias de outros tempos, como a do rapaz que em prova de amor oferece um presente muito simples: “o coração de sua mãe. E ele assim o fez. Apanhou um punhal, enfiou-o no peito da mãe e arrancou-lhe o coração. Depois, empolgado com o horror e a excitação do que fizera, correu através da floresta para onde morava sua bela amada. E, enquanto corria, prendeu o pé numa raiz e, caindo, deixou cair o coração que trazia nas mãos. Ao abaixar-se para apanhar o precioso coração, que lhe compraria o amor de uma mulher, ouviu-o dizer: ‘Meu filho, meu filho, tu te machucaste com a queda?’”.(p. 251).

Foto: PixaBay

            Em Por que ler os clássicos Calvino reúne ensaios e artigos sobre os clássicos; escritores, poetas, cientistas que compõem a sua biblioteca destinada, se voltarmos a Jaeger, a traduzir o esforço próprio para abranger a totalidade do humano, ou ao menos configurá-lo numa espécie de patafísica, que não se reduza a uma ciência das soluções imaginárias (p. 264).

            Gosto de reter na mente essa tessitura imaginária haurida dos clássicos para esse esforço abrangente. Gosto de me perguntar e de buscar seguir os fios imaginados e às vezes reinventados dessa tessitura. Renová-los, ver transmutar-se o homem da formação descrita por Jaeger, na cultura grega resgatado no feminino que se emancipa nas surpresas dos arquétipos de algum modo deslocalizados, atemporais, insurgentes, ainda assim universais, em direção ao cósmico, além do humano (Sirius Alfa. A Lei da Atração – Mistérios e Explicação da Evolução. Amazon:Formato eBook Kindle, 2021).

            Assim é que encontro Hua Mulan, a jovem que para honrar o pai e a família se disfarça de guerreiro, se une a um exército exclusivamente masculino conforme descrito no famoso poema narrativo chinês A Balada de Mulan. A obra foi composta no século VII, durante a maior parte do qual a dinastia Tang (618-907) governou a China. A coleção de cantos à qual pertencia Hua Mulan originalmente se perdeu, no entanto, preserva-se hoje uma versão posterior, incluída em uma antologia de poemas líricos e baladas compilada por Guo Maoqian no século XI ou XII.

           Lenda ou tradição composta de fragmentos de eventos com alguma historicidade, o certo é que há narrativas, romances, filmes (a Disney lançou recentemente uma versão dessa memória) e a mais referenciada A balada de Hua Mulan cuja cópia mais antiga está no Music Bureau Collection, antologia de poemas e canções compiladas por Guo Maoqian entre os séculos XI e XII que conserva a guerreira Hua Mulan viva no imaginário de seu povo.

           A versão mais antiga da “Balada de Mulan” consiste em 31 dísticos, compostos principalmente de frases com cinco caracteres. Existem, entretanto, muitas outras versões. Abaixo, confira a tradução de uma delas, disponibilizada pelo site Epoch Times:

 

Suspiro após suspiro,

Mulan tece diante de sua porta.

 

Ninguém pode ouvir o som do tear,

apenas os suspiros da pobre menina.

 

Pergunte-a quem está em seu coração,

ou quem está em sua mente.

 

Ninguém está em seu coração,

e ninguém está em sua mente.

 

Ela viu os rascunhos militares ontem à noite,

Khan está convocando muitos soldados.

 

Uma dúzia de listas rascunhadas,

cada uma com o nome de seu pai.

 

O pai não tem um filho crescido,

Mulan não tem irmão mais velho.

 

Ela decide adquirir um cavalo e sela,

e alistar-se em lugar de seu pai.

 

No mercado leste, ela compra um cavalo,

no mercado oeste, uma sela.

 

No mercado norte, ela compra um freio,

e, no mercado sul, um longo chicote.

 

À alvorada, ela se despede de seu pai e de sua mãe,

ao anoitecer, ela acampa às margens do Rio Amarelo.

 

Ela não podia ouvir os pais chamando pela filha,

apenas as águas do rio fluindo.

 

À alvorada, ela deixa o Rio Amarelo,

ao anoitecer, ela chega à Montanha Negra.

 

Ela não podia ouvir os pais chamando pela filha,

apenas os cavalos selvagens na vizinhança do Monte Yan.

 

Viajando dez mil milhas ao encontro da batalha,

passando montanhas e serras como se voando.

 

 

Ventos amargos carregam os sons do sino do vigia,

uma luz pálida brilha em sua armadura de ferro.

 

Generais morreram em uma centena de batalhas,

os soldados mais fortes retornaram após dez anos.

 

Eles retornaram para encontrar o imperador,

o Filho do Céu sentado no palácio imperial.

 

Ele recordou seus méritos em doze pergaminhos,

e concedeu centenas de milhares de recompensas.

 

O Khan pergunta a Mulan o que ela deseja,

um título de grande ministro não tem utilidade para Mulan.

 

Ela pede uma montaria rápida para levá-la a milhares de milhas,

e trazer a filha de volta para casa.

 

 

Quando pai e mãe ouvem sobre sua chegada,

eles se apoiam até o portão da cidade.

 

Quando a irmã mais velha ouve sobre sua chegada,

ela se adorna e a espera em sua porta.

 

Quando seu irmão mais novo houve sobre sua chegada,

ele afia a faca e prepara o porco e a ovelha.

 

“Abram a porta de meu quarto ao leste, eu sento no sofá de meu quarto ao oeste.

Removo meu uniforme de guerra, e visto minhas roupas dos velhos tempos.”

 

De frente para a janela, ela prende seus cabelos macios como nuvem,

no espelho, ela põe flores amarelas.

 

No portão, ela encontra seus camaradas,

eles ficaram todos surpresos.

 

Lutando juntos por doze anos,

eles jamais suspeitaram que Mulan fosse mulher.

 

Lebres macho gostam de chutar e pisar,

lebres fêmeas têm olhos enevoados e acetinados.

 

Mas se as lebres correm lado a lado,

quem pode dizer qual é ele ou ela?

            E então encontrar Mulan, na Donzela que vai à Guerra, representada no romantismo português recriado por Almeida Garret, com sua literatura de raiz lusitana para enaltecer povo e cultura. Veja-se a seguir o seu texto e se houver motivação a bem humorada recitação de Ariano Suassuna, que me serviu de fonte para pesquisar o texto na origem (https://www.youtube.com/watch?v=8iOcjbsyT_o):

 

A DONZELA QUE VAI À GUERRA

(Almeida Garrett)

 

Já se apregoam as guerras

Entre a França e o Aragão:

— Ai de mim que já sou velho,

Não nas posso brigar, não!

De sete filhas que tenho,

Sem nenhuma ser varão,

Responde a filha mais velha

Com toda a resolução:

— Venham armas e cavalo

Que eu serei filho varão.

—Tendes los olhos mui vivos.

Filha, conhecer-vos-ão.

— Quando passar pela armada

Porei os olhos no chão.

—Tendes los ombros mui altos

Filha, conhecer-vos-ão.

— Venha gibão apertado,

Os peitos encolherão.

—Tend’-las mãos pequeninas

Filha, conhecer-vos-ão.

— Venham já guantes de ferro

E compridas ficarão.

— Tend’ los pés delicados,

Filha, conhecer-vos-ão.

— Calçarei botas e esporas,

Nunca delas sairão.

 

— Senhor pai, senhora mãe,

Grande dor de coração,

Que os olhos do conde Daros

São de mulher, de homem não.

— Convidai-o vós meu filho

Para ir convosco ao pomar,

Que, se ele mulher for,

À maçã se há-de pegar.

A donzela, por discreta,

O camoês foi apanhar.

— Oh que belos camoezes

Para um homem cheirar!

Lindas maçãs para damas

Quem lhas pudera levar.

— Senhor pai, senhora mãe,

Grande dor de coração,

Que os olhos do conde Daros

São de mulher, de homem não.

Convidai-o vós, meu filho,

Para convosco jantar,

Que, se ele mulher for,

No estrado se há-de encruzar.

A donzela por discreta,

Nos altos se foi sentar.

— Senhor pai, senhora mãe,

Grande dor de coração,

Que os olhos do conde Daros

São de mulher, de homem não.

— Convidai-o vós, meu filho,

Para convosco feirar,

Que, se ele mulher for,

Às fitas se há-de pegar.

A donzela, por discreta,

Uma adaga foi comprar.

— Oh que bela adaga esta

Para com homens brigar!

Lindas fitas para damas:

Quem lhas pudera levar!

— Senhor pai, senhora mãe,

Grande dor de coração,

Que os olhos do conde Daros

São de mulher, de homem não.

— Convidai-o vós, meu filho,

Para convosco nadar,

Que, se ele mulher for,

O convite há-de escusar.

A donzela, por discreta

Começou-se a desnudar…

Traz-lhe o seu pajem uma carta,

Pôs-se a ler e pôs-se a chorar.

— Novas me chegam agora,

Novas de grande pesar:

De que minha mãe é morta,

Meu pai se está a finar.

Os sinos da minha terra

Os estou a ouvir dobrar

E duas irmãs que eu tenho

Daqui as oiço chorar.

Monta, monta, cavaleiro,

Se me quer acompanhar.

Chegavam a uns altos paços,

Foram-se logo apear.

— Senhor pai, trago-lhe um genro,

Se o quiser aceitar;

Foi meu capitão na guerra,

De amores me quis contar…

Se ainda me quer agora

Com meu pai há-de falar.

 

Sete anos andei na guerra

E fiz de filho varão.

Ninguém me conheceu nunca

Senão o meu capitão;

Conheceu-me pelos olhos,

Que por outra coisa não.

           

            E eis ainda a personagem, vestida de Diadorim, campeando nos Cerrados e nas Gerais. Personagem-chave do romance Grande Sertão Veredas, de João Guimarães Rosa é tida como homem durante quase toda a narrativa. Apenas nas últimas páginas o narrador conta que, depois de sua morte, quando o corpo é despido e lavado, descobre-se que se tratava de uma mulher. Diadorim havia conhecido Riobaldo, quando ainda eram jovens, em uma travessia do rio São Francisco. Nessa ocasião, ela já vivia disfarçada de menino e dizia chamar-se Reinaldo, para aturdimento de Riobaldo, quando se reencontram que se deixa apaixonar, apesar do que esse sentimento contraditório, reprimido, proibido, provoque no jagunço.

            Por isso, retomando Calvino, se os clássicos servem para entender quem somos e aonde chegamos, o que o livro propõe é que nos disponibilizemos para inventar para cada um de nós uma biblioteca ideal de nossos clássicos…clássicos que sejam lidos não só por dever ou por respeito mas só por amor.

 

José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil,  Professor Titular, da Universidade de Brasília,  Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.

Nenhum comentário:

Postar um comentário