22 Janeiro 2020
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF), enviou um ofício à Procuradoria da República no Distrito Federal (PR/DF) para pedir que o ex-secretário especial de Cultura Roberto Alvim seja processado por racismo e improbidade administrativa. O dramaturgo foi exonerado do cargo na última sexta-feira (17), após veiculação de um vídeo oficial com apologia ao nazismo.
A reportagem é de Cristiane Sampaio Brasil, publicada por Brasil de Fato, 21-01-2020.
A PFDC foi inicialmente provocada por um grupo de cinco pessoas formado pelo deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), a arquiteta judia Clara Levin Ant e os advogados Marcio Sotelo Felippe, Patrick Mariano e José Geraldo Sousa Júnior, que protocolaram uma representação no órgão pedindo providências diante do caso.
“As manifestações do secretário ofendem a Constituição e os princípios democráticos que são sufragados pela normativa internacional dos direitos fundamentais. Revelam – associando à adoção de políticas públicas, portanto, ações que estão ao abrigo do próprio Estado – ideologia e fundamentação que são repudiadas por esses instrumentos”, argumenta José Geraldo.
O vídeo veiculado pelo ex-secretário menciona trechos de um discurso histórico feito pelo ministro da Propaganda de Hitler durante a Alemanha nazista, Joseph Goebbles.
Professor do curso de Direito da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), José Geraldo ressalta que a estética e o conteúdo do material disseminado por Alvim dão abrigo a posturas de ódio e discriminação, uma vez que remetem ao nazismo, diretamente associado ao massacre do povo judeu.
“[Eles] sugerem formas de ações políticas que violentam a dignidade humana e que, historicamente, representaram formas de genocídio, de eliminação de comunidades, de ações políticas violentas contra segmentos sociais diferenciados dessas ideologias”, afirma o jurista, mencionando a imputação de racismo à postura do ex-secretário.
O argumento foi endossado pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e o seu procurador-adjunto, Marlon Alberto Weichert, que assinam conjuntamente a representação dirigida à PR-DF. Eles destacam que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) aponta para o entendimento de que o crime de racismo não prescreve e ainda de que há um nexo entre a imprescritibilidade e as questões relacionadas à memória histórica.
“Jamais se podem apagar, da memória dos povos que se pretendam justos, os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável”, citam os procuradores, em referência à Corte.
Assim como os signatários da representação da sociedade civil, os membros do MPF destacam ainda que teria havido inadequação da postura do ex-secretário diante da Lei de Improbidade Administrativa (nº 8.429/92). A norma enquadra agentes públicos diante de ações ou omissões as quais “violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições”.
Nulidade dos atos
Outro pedido feito pelos cinco integrantes da sociedade civil – e também endossado pela PFDC – diz respeito à anulação das nomeações assinadas por Roberto Alvim enquanto ele esteve à frente da pasta.
“Elas devem ser declaradas nulas porque não é possível conviver com a dúvida de que subsistam, naquela secretaria especial, pessoas que sigam adiante com os mesmos propósitos”, argumentam os procuradores, que também pede a anulação do edital do Prêmio Nacional das Artes.
Objeto do vídeo em questão, o edital é apontado pela PFDC como algo que “reproduz a ideologia nazista de outorgar ao Estado o poder de eleger quais formas de manifestação artística devam ser valorizadas”.
“As violações estão bem definidas. Nós esperamos que a Procuradoria da República no DF adote essas medidas e que a Justiça aja como Justiça”, afirma José Geraldo.
Alvim
Em manifestação feita após as múltiplas reações que surgiram diante do caso, Roberto Alvim afirmou que escreveu o texto do discurso do vídeo “a partir de várias fontes e ideias” que teriam chegado “de muitos lugares”. Ele disse não saber da referência nazista dos trechos e chegou a atribuir o episódio a uma “ação satânica”.
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