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sábado, 29 de setembro de 2012

Parecer da Prof. Nair Bicalho ao Conselho Universitário para a concessão de título de Professor Emérito ao Professor José Carlos Córdova Coutinho


UnB/Doc nº 194/2012
Indicação do professor José Carlos Córdova Coutinho para título de Professor Emérito

Parecer ao Consuni

         A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB decidiu indicar para outorga do título de professor emérito, após análise e deliberação favorável de seu Conselho, conforme reunião nº 328, realizada em 12/07/2012, o professor aposentado JOSÉ CARLOS CÓRDOVA COUTINHO.

         A proposição original, assinada pelos professores Benny Schvasberg, Elane Peixoto e Márcio Buson, apóia-se no estatuto e regimento da universidade, arts. 66 e 174, fundamentando a proposta em justificativa cuja síntese transcrevo:
         “O Professor Coutinho ingressou na UnB em 1968. Após esta data realizou estudos de pós-graduação no exterior, retornando ao Brasil para o desenvolvimento de atividades docentes na graduação e na pós-graduação do curso de arquitetura e urbanismo, somente encerrados após 37 anos de casa, mediante sua aposentadoria compulsória, em 2005. Ao longo de sua carreira acadêmica o Professor Coutinho teve profícua atuação docente e em órgãos e instâncias da Universidade, assim como fora dela, em instituições profissionais e organismos de representação pública ligados à Arquitetura e ao Urbanismo, às Artes e à Cultura. Em particular, destacamos seu papel como um permanente ativista e militante da cidade de Brasília, contribuindo há mais de quatro décadas como um intelectual crítico, independente e propositivo, para o aprofundamento e a qualificação do debate sobre Brasília, sua preservação como Patrimônio Cultural da Humanidade, e contribuindo para traçar os rumos do seu desenvolvimento urbano e territorial”.

         O exame do memorial descritivo que acompanha a proposição, traduz bem o que ali se expressa como “trajetória acadêmica e intelectual e atuação profissional e cidadã”. Desse memorial se vê que o professor Coutinho, vindo a integrar os quadros da UnB a partir de 1968, forma parte do grupo de reconstrução da universidade após a diáspora de 1965, tão bem descrita por Roberto Salmeron em seu livro A universidade interrompida  (Brasília, ed. UnB, 2ª. edição, 2012). Como tal, ele integra o núcleo crítico de retomada do projeto da UnB, apesar do vigor fortemente restritivo do grupo interventor, apoiado no modelo de segurança derivado do AI-5 e de sua expressão universitária, o Decreto-lei nº 477.
         Tendo assumido, nesse período a direção do Departamento de Teoria e História da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, então ainda vinculada ao Instituto de Artes, passou a ser o diretor do Instituto de Arquitetura e Urbanismo quando este se tornou autônomo.

         Em tempos difíceis, de autoritarismo cruento, o professor Coutinho enquanto contribuía para o trabalho de reconstrução de sua unidade e da UnB o fez de modo a preservar a integridade de seu comprometimento com a resistência democrática, na universidade e na cidade. Conforme anotam os autores do memorial:
         “Cabe destacar que, ao longo dos anos de vigência do regime militar, especialmente quando o obscurantismo e a perseguição política e ideológica abateram-se sobre a UnB, o Prof. Coutinho manteve uma postura clara e firme em defesa das liberdades democráticas, sendo sempre uma referência solidária e intransigente no repúdio a toda e qualquer prática autoritária, tanto no ambiente universitário como, mais amplamente, no âmbito das sociedades brasileira e latino-americana em geral”.

         Em depoimento para fundamentar a proposta, o professor Marco Antonio Rodrigues Dias que foi vice-reitor da UnB entre 1976 e 1980, tornando-se depois Diretor da Divisão de Ensino Superior da UNESCO, em Paris, até se aposentar em 1999, confirma o papel desempenhado pelo professor Coutinho. E o faz também para por em relevo a sua atitude na crise de 1977, em que greve estudantil resultou na expulsão de mais de 30 alunos, que só foram reintegrados por posterior decisão judicial, uma vez que no Conselho Universitário somente duas vozes se opuseram ao ato de expulsão adotado com base no DL 477: a do próprio Marco Antonio Dias e a do professor Coutinho.

         Vale transcrever esta parte do depoimento mencionado:
         É difícil de se analisar uma atitude como a do Professor Coutinho, hoje, passados 35 anos. Na época, era necessária uma grande força de convicção e uma coragem a toda a prova para se opor ao que estava impondo a administração da Universidade. A prova é que apenas um tomou a atitude de enfrentar as pressões. Os demais, ou eram favoráveis a uma repressão cega, ou não encontraram força para reagir à pressão que sobre eles se fazia e à violência institucional imposta aos jovens estudantes. O professor Coutinho, que liderava um grupo de professores competentes e inovadores, que dirigia uma unidade que se destacava pela excelência do ensino ministrado e pela visão social dos membros que compunham sua comunidade e ainda pela qualidade dos trabalhos de pesquisa sobre novas formas ali realizadas, foi capaz de se posicionar segundo sua consciência. Era um grande acadêmico na sala de aula, um bom gestor da unidade acadêmica a ele entregue, e um professor capaz de defender os princípios humanistas e os ideais universitários nas condições as mais difíceis. Um exemplo para a comunidade acadêmica”.

Este episódio está registrado no livro Sonho e realidade:  o movimento docente na Universidade de Brasília 1977-1985 . Publicado em 1994 pela Adunb, o livro conta a história da fundação da entidade numa conjuntura de afirmação democrática da liberdade de cátedra e de organização profissional dos professores e de defesa da própria UnB ainda sob forte intervenção. A narrativa reafirma a participação do professor Coutinho mas faz mais do que isso. No capítulo Nasce o Conselho Universitário da UnB mostra que esse colegiado, previsto no estatuto mas não instalado, foi formado então para as circunstâncias descritas de cumprir requisito legal de fundamentação do ato do reitor, expulsando os estudantes e de modo muito submisso àquela autoridade investida de poderes derivados dos atos de exceção do governo ditatorial. A coragem e a independência do professor Coutinho, naquela ocasião altiva e solitária, assinalaram contudo, o que viria ser no futuro, que é o presente do colegiado máximo desta universidade, o órgão soberano, plural e plenamente deliberativo da instituição.

O memorial descreve ainda outras atribuições desempenhadas pelo professor Coutinho na universidade e indica a produção mais relevante do professor. Além disso, traça a sua trajetória fora da universidade. Com efeito, segundo o memorial “De forma simultânea e complementar a sua trajetória no âmbito acadêmico, o Prof. Coutinho ofereceu inúmeras contribuições externas à Universidade de Brasília. Atuou na esfera do governo federal como membro da Comissão de Ensino de Arquitetura e Urbanismo (CEAU) do DAU/MEC entre 1973 e 1979 e na esfera do Governo do Distrito Federal, como membro dos Conselhos de Cultura entre 1990 e 1992 e de Educação entre 1996 e 1998. Cabe ressaltar o papel do Prof. Coutinho como liderança da categoria profissional dos arquitetos de Brasília (IAB/DF), durante o período de 1982 a 1984. Nesta esfera de atuação, participou da Coordenação do Programa Educativo da Bienal de Arquitetura de Brasília em 2002, foi membro do júri do Prêmio Rodrigo Mello Franco outorgado pelo IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 2006 e representou Brasília no Simpósio sobre Cidades Contemporâneas em Le Havre, França, em 2007”.

O professor José Carlos Córdova Coutinho é reconhecidamente um dos mais destacados intérpretes do projeto urbanístico de Brasília na sua expressão social e cultural. Neste aspecto, aliás, é uma referência, sendo invariavelmente apresentado como um árbitro para a definição dos princípios e valores que fundamentam os discursos interpretativos sobre a cidade.

Notável, nesse sentido, é a percepção que trouxe da dimensão política que deveria balizar o plano orientador da cidade. Segundo Coutinho (Polis, aos 30. Brasília na Constituinte, Jornal de Brasília, 15/11/87, Caderno Especial Brasília), “era intenção explícita do autor de seu plano que Brasília, além de uma moderna urbs, no seu sentido mais pragmático e funcional, fosse também uma bela e monumental civitas, digna de sua condição de capital nacional. Esta dupla exigência estaria, segundo Lúcio Costa, atendida pelas características de seu plano vencedor. Mas havia uma outra exigência que não poderia se conter nos limites técnicos ou estéticos de um plano urbanístico, nem poderia ser alcançada através da outorga de qualquer ato de vontade oficial. Era a exigência de que Brasília, além de uma urbs e de uma civitas, fosse também uma polis. Esta terceira condição só poderia ser conquistada por sua população, quando se tornasse numérica e qualitativamente significativa, maturando suas formas de organização social e desenvolvendo meios próprios que lhe permitissem enfrentar a árdua prática de sua luta cotidiana, apropriando-se da urbs e da civitas, para acrescentar-lhe, finalmente, a dimensão da polis”.

O que se apresenta como síntese da trajetória e da biografia do professor Coutinho é o que se expressa na apresentação dos proponentes do título: “exemplo de conduta acadêmica, ética e cidadã”, perfil que diz bem, para todos que o conhecem, como efetivamente é reconhecido esse notável professor da UnB.

Aposentado por implemento de idade, continua a oferecer destacadamente sua contribuição à cidade e a UnB. Na universidade, depois de integrar a Comissão UnB nos 50 anos de Brasília, é membro muito ativo atualmente do Conselho Editorial da Editora UnB e da Comissão UnB 50 anos.

Conforme preceituam o Estatuto e o Regimento Geral da UnB, o título de Professor Emérito é concedido pela Universidade de Brasília (UnB) ao docente, aposentado na universidade, que tenha alcançado uma posição eminente em atividades universitárias. O professor José Carlos Córdova Coutinho detém, em sua plenitude, os requisitos que o habilitam a receber essa honraria.


O meu parecer é, pois, pela concessão do título de Professor Emérito ao professor José Carlos Córdova Coutinho.



                Professora Nair Heloisa Bicalho de Sousa
                    Conselheira Relatora do CONSUNI

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