O Direito Achado na Rua: nossa conquista é do tamanho da nossa luta

domingo, 8 de novembro de 2015

20 anos da RENAP: quem constrói a manhã desejada


Ludmila Cerqueira Correia*

Coimbra, 03 de novembro de 2015.


Conheci a RENAP ainda estudante de Direito na Bahia, quando participava do Projeto de Assessoria Jurídica Popular na Universidade Católica do Salvador. Esse projeto congregava estudantes e professores de Direito e de Serviço Social, que prestavam assessoria jurídica popular a uma associação de moradores de uma ocupação urbana em Salvador que lutava pelo direito de morar. Aqui é preciso registrar a importância da série O Direito Achado na Rua e da Revista de Direito Alternativo, leituras imprescindíveis nos nossos grupos de estudos à época. Nas atividades de formação que participávamos e, mais adiante, nos encontros regionais e nacionais da Rede Nacional de Assessorias Jurídicas Universitárias (RENAJU), sempre ouvíamos falar dessa “tal de RENAP”.
Assim também foi quando comecei a participar de atividades e cursos promovidos pela Associação de Advogadas/os de Trabalhadoras/es Rurais no Estado da Bahia (AATR-BA), que já integrava a RENAP. Aqui faço menção a dois associados da AATR (abrangendo os demais), pela sua grande contribuição, garra e compromisso na advocacia popular e nas lutas do povo: Marília Lomanto e Cloves Araújo, com os quais tive o prazer de trabalhar na Universidade Estadual de Feira de Santana.
O encontro com a RENAP aconteceu mesmo nos encontros da Confederação do Equador. Ali pude conhecer e reconhecer companheiros e companheiras da advocacia popular no nordeste, que atuavam em diversas áreas. Além disso, foram encontros em que havia a participação de estudantes, entendendo que ali também era espaço de formação e de troca de experiências. Em seguida, pude participar, finalmente, dos encontros nacionais da RENAP. Encontros de gerações diversas, de novos temas que também fazem parte da assessoria jurídica popular, de mais e mais advogadas populares na Rede, de mais estudantes (com destaque para a turma Elizabeth Teixeira, da UEFS), de confraternização e festa, de partilha e solidariedade, de angústias e sonhos, de pandeiro e violão... E tudo isso com a mística que aprendemos e congregamos com os movimentos sociais.     
Certa vez, ouvi uma colega advogada popular falar numa tal “professorização da RENAP”. Aquilo ficou martelando na minha cabeça, mas a ideia aqui não é problematizar o significado e a extensão dessa expressão. O fato é que muitas e muitos de nós, cada vez mais, estamos ocupando o espaço das universidades, sobretudo nos cursos de Direito, e contribuindo para a formação de mais estudantes que têm se engajado na extensão jurídica popular, com destaque para as AJUPs; influenciando novos conteúdos e formas para os projetos político-pedagógicos dos cursos de Direito; fazendo a diferença com propostas mais ousadas para os Núcleos de Prática Jurídica; criando novas linhas de pesquisa, com destaque para a pesquisa engajada, nos Programas de Pós-Graduação em Direito e em Direitos Humanos; mobilizando, organizando e formando mais turmas especiais de Direito para beneficiários da Reforma Agrária, através do PRONERA; enfim, ampliando as trincheiras das lutas com mais advogadas e advogados populares.
Muitas e muitos de nós que integramos a Rede podemos testemunhar o quanto as atividades de extensão jurídica popular universitária nos formaram e nos influenciaram para as nossas escolhas pela advocacia popular junto aos movimentos sociais, aos grupos subalternizados e às organizações de direitos humanos. Assim, na comemoração dos seus 20 anos de existência, também é papel da RENAP refletir e debater sobre a relação entre a educação jurídica e as práticas da advocacia popular hoje.

E é por isso que eu canto com Gonzaguinha...

“Eu acredito é na rapaziada
Que segue em frente e segura o rojão
Eu ponho fé é na fé da moçada
Que não foge da fera e enfrenta o leão
Eu vou à luta com essa juventude
Que não corre da raia a troco de nada
Eu vou no bloco dessa mocidade
Que não tá na saudade e constrói
            A manhã desejada...” 


* Ludmila Cerqueira Correia é advogada popular, extensionista e pesquisadora. Doutoranda em Direito, Estado e Constituição no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Brasília, integrante do Grupo de Pesquisa O Direito Achado na Rua, bolsista CAPES em estágio doutoral no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Professora do Departamento de Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba e Coordenadora do Grupo de Pesquisa e Extensão Loucura e Cidadania (Centro de Referência em Direitos Humanos da UFPB). Associada da AATR-BA e integrante da RENAP e do IPDMS.

Um comentário:

  1. Seus ensinamentos na Disciplica Direito dos Grupos Socialmente Vulneráveis me fizeram enxergar de outra forma o sentido do verdadeiro direito.

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